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Foco para escrever a dissertação do mestrado

Muitos leitores me pediram para que eu compartilhasse como tenho feito para escrever a dissertação do mestrado. Eu imagino que, ao concluir todo o processo, eu tenha dicas melhores e mais assertivas para dar, pois terei uma visão do todo, mas achei que também seria interessante mostrar um pouco essa visão “de dentro”, de como tem sido enquanto estou passando por esse processo.

Para quem não sabe, estou finalizando meu mestrado em Comunicação, neste semestre. Tem muito texto aqui no blog sobre o meu tema e sobre o mestrado como um todo. Dê uma olhada, se tiver interesse em saber mais. 😉

Muito se fala no meio acadêmico e entre pesquisadores sobre a saúde mental durante um mestrado ou um doutorado. No meu caso, o mestrado é justamente minha válvula de escape, com sinceridade. Ano passado eu tive um ano difícil pacas, após a morte da minha avó, e o que me manteve sã foi continuar a estudar no mestrado. Este ano, tive muitos percalços na vida profissional, e o mestrado me manteve centrada. Logo, se eu não me senti bem, foi por diversos outros aspectos que não a vida acadêmica em si. Este ano, especialmente a política e a realidade do Brasil têm me deixado bastante deprê. Ainda estou aprendendo a melhor maneira de lidar com tudo isso, mas de longe o mestrado me ajuda a me distrair e também a ter um entendimento mais crítico de tudo o que está acontecendo.

Hoje, eu consigo ver que existe sim uma pressão e que existem relações tóxicas dentro da academia. Por uma imensa sorte, meu orientador é uma pessoa incrível. Não sei bem se foi sorte, pois eu o escolhi já sabendo que ele tinha certas características que batiam com as minhas. Isso foi uma escolha consciente e que deu certo, mas também pode-se dizer que foi sorte pois ele poderia não ter aceitado o meu convite para me orientar e, na prática, ele também poderia não ser como eu esperava. E tem sido ótimo. Ele é muito consciente também desse lance da “depressão acadêmica”, e fica atento a isso o tempo todo, diminuindo a pressão e acertando o foco sempre que necessário.

Nos últimos dias tivemos uma reunião de um dos grupos de pesquisa que participo, e uma aluna que está iniciando o pré-projeto para o mestrado disse que estava muito estressada, visivelmente com questões individuais que ela deveria tratar em uma terapia. E fazer terapia é importante para todo mundo. A primeira coisa que quero te falar, então, é: por favor, não ache que seus problemas e questões internas vão se resolver sozinhos. Mestrado, doutorado, até mesmo a faculdade em si, são cursos que trazem um volume imenso de atividades à sua vida. O problema não está no meio acadêmico, mas em você se cuidar, ser compassivo/a consigo mesma/o, entender que cada pessoa está em uma fase diferente, não se cobrar tanto, se organizar, enfim.

Eu também acho que rola uma espécie de “fetiche acadêmico” de dizer “nossa, estou finalizando a dissertação e estou sem dormir” ou “posso dormir quando estiver morto”. Esse tipo de discurso é alimentado diariamente e, com sinceridade, acho que não ajuda em nada. Venho tentando eu mesma não repetí-lo, porque é muito fácil você dizer determinadas frases apenas para o outro ter empatia e vocês se confortarem. Sim, existem problemas, mas, mais uma vez, acredito que foco seja tudo na vida. E eu prefiro focar no meu desenvolvimento intelectual, no meu trabalho, enfim, nas coisas boas dele, e não nas supostas coisas ruins.

Sobre a dissertação, vários leitores me pediram dicas para focar na hora de escrever. Eu não tenho dicas específicas para a dissertação em si, mas para qualquer trabalho aprofundado que demande produção intelectual. Escrever a minha dissertação demanda um estado de fluxo semelhante a escrever um post para o blog ou uma apostila para um curso. Claro que são demandas diferentes, com técnicas diferentes. Mas, em termos de foco, dá no mesmo.

O que posso dizer, sem sombra de dúvidas, é sobre todos os NÃOs que tenho distribuído para conseguir focar na dissertação. Veja, a vida continua. O mundo continua girando. Existem coisas que não posso tirar, especialmente no meu trabalho, que garantem o meu sustento (e até a possibilidade de fazer um mestrado). Mas existem MUITOS projetos que podem esperar. E estou fazendo todos eles esperarem. Especialmente projetos meus, particulares. Mas também projetos acadêmicos.

Outro dia escrevi um post sobre “coisas que deixei de lado para ter o que tenho”. Gente, para cada SIM que digo, disse uns 450 NÃOs. É impossível “listar” tudo o que deixei de lado pois são infinitas coisas. E outra, qual o ponto de listá-las? Prefiro dar atenção ao que eu disse SIM – essas sim relevantes o suficiente para fazerem parte da minha vida no momento e me permitirem ter foco. Deixar outras coisas de lado significa justamente não focar nelas, então para que perder tempo tentando listá-las? Não, não. Não me peçam isso e, por favor, fica de recomendação que você também não o faça. Não leva a nada, a não ser a frustração.

Eu tinha planejado dedicar o meu mês de julho para o mestrado da seguinte maneira:

  • primeira semana: artigo da última disciplina
  • segunda semana: fechar o artigo do evento que participei no sul (prazo: 15/7)
  • terceira e quarta semanas: dois capítulos da dissertação

No entanto, nas duas últimas semanas do mês eu passei por uma transição enorme, que impactou completamente a minha vida e me colocou em um turbilhão de coisas acontecendo. Ainda não me sinto preparada para falar mais sobre isso, mas em algum momento falarei. O que você precisa saber é que foi TRASH. E o fato prático é que não consegui cumprir o meu prazo. Entregar esses dois capítulos no início de agosto era o melhor dos cenários, no entanto. Como não eram prazos apertados, não me estressei. Gente, a vida é isso aí. Se eu for me cobrar por todas as coisas que eu não fiz no prazo “desejável”, certamente vou enlouquecer. (Para vocês terem uma ideia, o prazo real é final de novembro. Eu que queria entregar antes.)

Conversei com o meu orientador agora no início de agosto, expliquei o que aconteceu e reorganizamos nosso cronograma. Projeção otimista: finalizar até o meio de setembro. Se não for possível, finalizar em outubro. E tá tudo bem. Claro que isso não significa deixar para a última hora. Eu quero entregar antes. Mas me dá uma perspectiva um pouco melhor, sabe? Não preciso ficar desesperada.

Para conseguir focar na entrega da dissertação, esses foram os ajustes que fiz – apenas no nível acadêmico:

  • tirei todas as leituras que eu estava em andamento e deixei apenas as leituras necessárias para a dissertação
  • desisti de participar como ouvinte de uma das disciplinas (prefiro focar o horário na escrita da dissertação)
  • desisti de participar de um seminário do grupo de pesquisa que acontecerá em outubro
  • desisti de ministrar duas disciplinas que eu fui convidada para um programa de MBA (tenho a vida toda para fazer isso)
  • resolvi não fazer o estágio docência neste semestre (acompanhamento pedagógico com um professor para pegar didática em sala de aula de graduação)
  • não vou participar de absolutamente NENHUM evento apresentando trabalhos
  • não vou produzir mais nada em termos acadêmicos (artigos etc.) além da dissertação
  • não vou pensar no pré-projeto para o doutorado (só depois da entrega da dissertação)
  • toda semana, tenho pelo menos uma meta relacionada à dissertação, como por exemplo: finalizar o capítulo 2

Isso para mim já fez toda a diferença. Tudo isso são atividades que poderiam não tomar tanto tempo, mas tomam tempo. Um pouquinho aqui e um pouquinho ali já fazem muita diferença.

Isso porque nem entrei no aspecto profissional da empresa e no pessoal. Vish, muita coisa incubada. E tô super sussa com relação a isso.

Para a escrita em si, eu não tenho muito segredo, pois ESCREVER faz parte da minha rotina. Eu sou escritora. Todos os dias escrevo. Para a dissertação, vale o mesmo raciocínio. Leio e estudo todos os dias, assim como escrevo um pouco todos os dias. Para mim, não funciona essa coisa de “vou bloquear um período na minha agenda para escrever na quinta de manhã”, porque na quinta de manhã posso estar sem pique e energia para escrever. Eu organizo todas as minhas atividades na vida de modo que eu consiga aproveitar o melhor de cada momento para fazer o que a minha energia proporciona como melhor alternativa para que eu faça. Simples assim. Como dica, diria que você precisa se conhecer e entender o que funciona melhor para você em termos de fluxo de trabalho. Tem gente que prefere bloquear o tempo na agenda. Sabe? Então não tem certo ou errado, mas testes e manter o que funciona.

Estou dizendo NÃO a um monte de projetos novos simplesmente porque, quanto mais tempo eu abrir na minha agenda, mais tempo terei para escrever e terminar logo a dissertação. É assim que funciona para tudo na vida, gente.

Uma dica rápida que pode ajudar é sobre a lista “depois de”. ->

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21 comentários em “Foco para escrever a dissertação do mestrado”

  1. Nicole Cristina Rodrigues

    Oi Thaís! Adorei cada palavra! Que sopro de esperança ler esse texto. É urgente ouvir de especialistas como vc e tornar isso comum o fato que devemos dizer nãos, respeitar nossos limites e prioridades e especialmente, entender que está tudo bem quando algo foge do esperado e que sim, o mundo continua aí (sendo bem otimista, claro) !
    Muito obrigada por tudo e por tanto! Um abraço!

  2. Oi Thaís, obrigada por mais um conteúdo relacionado ao mestrado, estou finalizando o meu também e todos os posts ajudaram muito. Não tive tanta sorte quanto ao orientador e tive que desenvolver toda a ideia da dissertação sozinha, então seus posts foram uma salvação pra me manter centrada no decorrer dessa fase. Acho interessante pontuar que, apesar do meu mestrado ser em exatas, e muita coisa do que se tem disponível na internet não ser muito prático pra esse ramo (por exemplo, na parte de adiantar a escrita, pois às vezes mexemos com dados ou variáveis muito imprevisíveis, e isso pode mudar o rumo do trabalho inteiro), as dicas de organização se aplicam muito bem pra manter uma constância no trabalho. Obrigada pela generosidade em compartilhar esses conteúdos de um ponto de vista realista, com certeza me ajudam a manter os pés no chão e a não me cobrar tanta perfeição nos resultados.

    1. Emília, tb sou estudante da área de Exatas (tô num Doutorado na Engenharia) e a gente não acha muita gente da nossa área escrevendo sobre o processo, e o nosso processo de produção é muito diferente mesmo. Estou com minha terapeuta há mais de um ano e sempre que falo que estou desenvolvendo a tese com minha terapeuta ela se refere como se eu estivesse escrevendo, hehehe. Eu falo que não é bem escrever, que por enquanto é geração e análise de dados, mas foge do comum mesmo… O legal é que o conteúdo da Thais é amplo e de qualidade e nos ajuda demais apesar das diferenças!

  3. Fico imensamente feliz com a leveza que seu texto me traz nesse momento de ver a final do Mestrado. Estou escrevendo a dissertação e em novembro estou defendendo. Com a ordem de prioridades e foco agora, posso deixar meus projetos para breve e finalizar essa etapa de forma mais rápida e sem muita cobrança comigo mesma. Você sempre compreendendo as necessidades de seu público. Imensamente grata!!!!

  4. mulherrr… que post sensacional… estou no doutorado e pegando mil coisas pra fazer.. estou no 3 período ainda, mas já me antevi fazendo essas concessões que comentou!

  5. Mando energias boas pra esse processo de mudança na sua vida Thais!

    Uma frase que ouvi recentemente, quem sabe pode ser útil na sua vida é, “você não pode se curar no mesmo ambiente que adoeceu”.

    Faz pouco tempo que peguei esse Insight seu sobre “lista depois de”, tem me feito muito bem, obrigado!

  6. Excelente. Estou me preparando para uma prova do mestrado e elaborando o meu pré-projeto e tenho tido dificuldades em me organizar nesse quesito. Isso de dizer não é complicado pra mim, parece que não posso fazer uma escolha que abra mão de algo.

  7. FRANCELINE RODRIGUES SILVA

    Fantástico o post, Thaís! Escreva um dia um texto sobre como aprender a “dizer não” (risos). Sério, fiquei impressionada de você conseguir dizer não para um programa de MBA no qual você ministraria duas disciplinas. Como você consegue fazer isso? Como você aprendeu a dizer não ao longo da vida? Como não sentir.se insegura ao dizer não para uma “grande oportunidade”?

    1. Pensei que poderia não concluir o mestrado, o que impactaria na minha carreira muito mais. Vão surgir outras chances de lecionar depois do mestrado. Quando eu disse “não” eu também estava com uma preocupação com a minha saúde que eu precisava me concentrar em resolver, e assumir mais um compromisso volumoso assim não me ajudaria.

  8. Seu empenho em traduzir a vida real de quem se organiza primeiro dentro e traduz isso com atitude e generosidade em servir me inspira um montão!
    Parei de temer a “vida acadêmica” este ano: retomei com uma pós-graduação, mas desejo seguir a jornada!
    Obrigada por dividir o seu processo: sem glamour, com afeto. 《♡》

  9. Olá Thais! Meu problema está sendo com os grupos de pesquisa. Tenho interesses bem variados dentro da minha área. E compreendem Grupo de pesquisa diversos. Meu problema é saber se não estarei me desfocando demais. Tem também o fator tempo dispendido. Mas acho tão rica esta troca com os mais diversos pesquisadores, que seria um pecado ficar restrita em apenas 1 GP se me interesso por mais de um não? Já estou acompanhando um, com interesse em outro bem afim com a minha área mas outro em vista bem interessante também, apesar de aparentemente fora do tema geral… Como vc lida com os grupos de pesquisa? Acompanha quantos no momento? Estão todos mega ativos?

    agradeço!!!

    1. Durante o mestrado, eu seria mais criteriosa com os grupos. O mestrado é um período curto, de dois anos, cujo foco deve estar na dissertação. Você terá a vida inteira para participar de grupos de pesquisa.

      No mais, te entendo. Eu cheguei a participar de três quando entrei no mestrado. Um deles eu participo por causa da situação política no Brasil. O grupo me ajuda muito a continuar alimentando um pensamento crítico com relação ao mundo. Ele contextualiza o que eu estudo. O outro é do meu professor orientador, e também não me sobrecarrega de maneira alguma.

      Penso que o parâmetro de análise é ver o custo benefício em termos de volume de atividades mesmo.

      Boa sorte. 😉

  10. Olá Thais, tudo bem?!
    Estou também no processo do mestrado e acredito que nossas pesquisas possuam algumas semelhanças: pretendo investigar como o trabalho das advogadas pode ser fator de adoecimento mental. Nesse momento, estou precisando muito trocar algumas ideias sobre bibliografia, sobretudo quanto ao recorte de gênero (mandei um e-mail para você sobre isso). Ficaria extremamente agradecida se você puder me responder. Beijos

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