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Voz

Eu fiz um curso de teatro este ano. Na primeira aula de “voz” a professora pediu para cada um da turma contar a sua história pessoal com relação ao seu uso da voz. Ouvi histórias incríveis, e aqui vai a minha.

Sempre fui uma pessoa tímida e introvertida que usava o humor como mecanismo de defesa. Por isso, na escola, eu aprendi a fazer piadas e a “forçar” um comportamento engraçadinho toda vez que eu fosse apresentar um trabalho na frente da sala, por exemplo. Uma vez, já adolescente, precisei apresentar, junto com o meu grupo, um trabalho em formato de peça de teatro. Naquele momento, em cima do palco, uma luz se acendeu em mim: “quero ser atriz!”. Mas meu problema sempre foi o fato de a cada 15 segundos me empolgar com uma profissão diferente, então passou.

Imagine como foi difícil para mim a época do vestibular, no sentido de escolher o curso que eu queria fazer! Para resumir a história: fiz Jornalismo e depois Publicidade. Hoje, acho engraçado o fato de trabalhar com criação de conteúdo, porque isso na verdade é um mix dos dois cursos. Meu professor orientador no mestrado outro dia disse que eu “deveria ser jornalista, porque escrevo muito bem”. Cômico, se não fosse trágico, mas irônico anyway. Em 2006, criei este blog, e aos poucos ele me levou a ser convidada para fazer palestras.

Comecei como todo palestrante começa: sem a menor ideia do que eu estava fazendo, a não ser a vontade de compartilhar aquele conteúdo que eu tinha. Sempre me apeguei ao fato de que, se estava sendo convidada, era porque eu era reconhecida naquele assunto. Mas à medida que você começa a se envolver no meio, começa a reparar nos outros palestrantes e a buscar dicas para ser uma palestrante melhor. E isso só me fez ver como eu não era (na minha cabeça) uma boa palestrante.

Em 2014, passei a viver exclusivamente desse trabalho com organização e produtividade, e grande parte desse trabalho estava em dar palestras e ministrar cursos em sala de aula.

Quando comecei a ser contratada por um grande cliente para ministrar cursos em empresas, passei a ser cobrada de maneira diferente. Existia um sistema de avaliação e feedback, e as duas coisas que eu mais ouvia (e hoje sei como esse sistema era horrível) eram que 1) eu “deveria considerar emagrecer” e 2) “deveria procurar um fonoaudiólogo”.

Eu tenho uma “travinha” na voz desde sempre, desde criança. Não é língua presa – é apenas um vício de fala. Ele me faz enfatizar o “s” quando eu falo. Isso não me incomodava até ouvir de outras pessoas críticas a isso – aí fiquei envergonhada e com receio de falar. Outras pessoas me criticarem a respeito de algo que era tão íntimo mas que eu não via como “defeito” acabou com a minha auto-estima na época. Eu estava super feliz por estar dando aula sobre um assunto que eu amo, e recebi isso como resposta. Foi bem difícil, mas uma questão minha, interna, que precisava resolver, e eu sabia disso.

Procurei uma fono, e durante DOIS anos (!!!) eu foquei nos exercícios e em querer solucionar esse “problema”, achando que eu nunca seria uma boa palestrante ou professora se eu não consertasse essa questão. Eu me sentia inadequada o tempo todo. Foi realmente bem complicado, até que aconteceu uma coisa que me ajudou a ver tudo de uma outra maneira.

Fiz minha formação em coaching na metade de 2016. As pessoas que criticam tanto hoje em dia essas formações não têm ideia do bem que elas podem fazer aos profissionais qualificados. Eu era qualificada. E muito. Mas estava acostumada a focar nos meus problemas (em querer resolvê-los) o tempo todo, o que me levou inclusive a um diagnóstico de depressão na época. Isso foi bem no mês que eu fiz o curso. Mas, ao sair do final de semana do curso, eu saí outra pessoa. Me sentia a mulher maravilha. É óbvio que eu não acho que “coaching” seja solução para ninguém, especialmente quem estiver com depressão ou com distúrbios relacionados a ansiedade. Mas, PARA MIM, na época, foi uma mudança total de cenário, e tudo o que posso fazer é compartilhar a minha experiência pessoal aqui, sinceramente. Afinal, é um blog.

Fotos da época (antes e depois do curso):

Eu acho que elas refletem bem a mudança na minha auto-estima. Cortei o cabelo, fiz maquiagem etc.

Um ponto chave dessa formação foi entender que eu tinha muitos pontos fortes que eu estava deixando de lado para prestar atenção demais nos meus pontos fracos. É claro que você pode querer trabalhar nos seus pontos fracos, mas isso não pode se tornar o seu foco, fazendo com que você deixe de trabalhar o que faz de melhor também ou, principalmente, pois esses pontos fortes são o que você faz de melhor!

A partir daquele momento, eu passei a focar enṭo no que eu era melhor Рque, pasmem (ou ṇo): eram muitas coisas! E eu estava negligenciando todas elas totalmente, em detrimento de um trabalho de corre̤̣o em supostos pontos fracos que eu tinha!

Por exemplo, no curso de coaching eu consegui desenhar a minha missão pessoal, quando eu descobri que as três coisas que eu mais gostava de fazer eram: escrever, dar aulas e conversar. Foi esse entendimento que me levou a querer trabalhar com coaching também e a depois desenvolver outros trabalhos, como a mentoria, mas isso é assunto para outro post.

Uma das coisas que eu considerava (e ainda considero) um ponto forte eram os meus conhecimentos e a minha paixão pelo método GTD, por exemplo. Eu ficava tão preocupada com a FORMA da minha voz que não tinha parado para pensar em todas as coisas que eu tinha para dizer! E eram muitas!

Ou seja: a partir do momento que eu resolvi focar em todas as coisas que eu considerava urgentes de serem ditas ao mundo, a travinha na minha voz, o meu peso, tudo isso passou a ser um mero detalhe que não deveria jamais atrapalhar o conteúdo daquilo que eu tinha para compartilhar. Eu mudei completamente o meu foco. Era “urgente” compartilhar tudo aquilo. Eu não via a hora de começar!

Em resumo: mais do que externalizar em voz alta esse conteúdo que eu queria compartilhar, buscá-lo dentro de mim com consciência situacional, paixão e muita vontade de servir aquelas pessoas que estavam me ouvindo, de ajudar – isso sim fez com que eu encontrasse a minha própria voz, e eu tive a minha auto-estima de volta. Passei a ser elogiada pelas mesmas pessoas que antes me criticavam. Porque, no fundo, hoje vejo que tais “falhas” que eu tinha na verdade apenas evidenciavam as inseguranças que eu sentia. (não estou abstendo a responsabilidade do que as tais pessoas me falaram. só quero dizer que superei essas críticas.)

A tal “voz” então está muito mais relacionada a você ter efetivamente o que dizer e de querer fazer isso com tanta paixão e certeza que o resultado será incrível não importam quantas “falhas técnicas” você tenha.

Em junho deste ano, eu tive a oportunidade de ser a única brasileira no palco do GTD Summit, um evento global do GTD, falando sobre o método, palestrando em inglês, ainda! Em nenhum momento eu foquei no “ai, eu não sou boa no inglês!”, mas sim no conteúdo que eu queria passar! E isso sem dúvida é fruto de tudo o que aprendi nos anos anteriores! Inglês não é minha língua nativa, e tá tudo bem! Dê seu melhor, garota! Eu fiquei focando então no que eu queria expressar – voz e corpo inclusos – mas essencialmente naquilo que eu gostaria de dizer – o conteúdo em si.

Ao subir naquele palco, não apenas o reconhecimento internacional como palestrante, mas a minha percepção de como na verdade eu AMO fazer palestras, estar no palco, ensinar, compartilhar e, acima de tudo, aprender mais sobre mim mesma, eram os aspectos mais motivadores para mim naquela situação.

Photo by Dan Taylor

Photo by Dan Taylor

Photo by Dan Taylor

Logo, a Thais que apresentava trabalho na frente da sala se juntou à Thais que se apresentou no teatro da escola, que por sua vez se ligou à Thais que fazia palestras sobre blogs e, por fim, à Thais que come GTD no café-da-manhã porque ama esse negócio. Como dizia Steve jobs, em algum momento os pontos se conectam. E isso é tudo que eu gostaria de dizer hoje sobre a minha voz, a prática de oratória e sobre ser professora como aspecto de servidão às pessoas que estão interessadas em aprender mesmo. Isso é o que considero estilo de vida de uma palestrante. Eu simplesmente precisava compartilhar essa experiência porque eu queria mostrar como muitas vezes o fato de a gente focar em pontos fracos pode fazer a gente perder o rumo. Retome o seu, querido leitor ou leitora. Você tem coisas importantes a compartilhar. Foque nisso. <3

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37 comentários em “Voz”

  1. acompanho seu blog há anos e não posso deixar de dizer que este foi o primeiro post que me fez chorar :~
    perdi o rumo e não estou sabendo direito como voltar…
    obrigada pelo texto

  2. Thais, eu, que te acompanho há muitos anos, vi esse processo acontecendo. E adoro ver essa flor desabrochando em você. Lembro de você falando que estava fazendo fono – e entendia, é claro, mas nossos considerados “defeitos” são também nossa marca. Gosto bastante do som que você faz quando fala, o jeito diferente que mexe a boca (não que o meu gostar seja relevante, né? Mas eu curto). Definitivamente, não há problema em ser diferente – seria muito tedioso se fossemos todos iguais. E, acima de tudo, sempre gostei de ouvir o que você tinha a falar (com mais ou menos quilos, como fono ou sem, com muito treinamento ou sem nenhum), e com certeza foi imensamente importante no meu próprio crescimento em diversos níveis e esferas. Fico sempre intrigada porque parecemos estar vivendo e nos interessando por coisas parecidas, provavelmente porque somos mães, professoras, profissionais e temos a mesma idade, rs. Obrigada por falar – e poxa, continue mesmo falando. A gente vai apreciando por aqui.

  3. Tão bom ler um ‘testemunho’ desses. É incrível como no mundo de hoje a gente se cobra, porque todos tem opiniões e se acham no direito de falar na hora e forma que melhor entenderem. É preciso chegar a este nível de maturidade para se dar conta e fazer um contraponto. Seu texto é libertador nesse sentido. Obrigada!

  4. Você é inspiradora demais, Thais.
    Te acompanho há muuuuuuitos anos e vibro com cada conquista e superação sua.
    Obrigada pela partilha e luz pra ti! Grande beijo

  5. Ei Thais, bom dia! acesso seus conteúdos já algum tempo e quero que saiba que é muito gratificante poder ler seus textos, eles realmente ajudam. Muito obrigada por compartilhar seu conhecimento e suas experiencias, sem dúvida faz muita diferença pra mim! Muita luz no seu caminho hoje e sempre.

  6. Desde quando comecei a te seguir, esse é absolutamente o melhor texto!
    Talvez porque eu realmente precisava entender que estou focando nos meus pontos fracos!
    Obrigada por compartilhar a sua experiência!

  7. Obrigada Thais, por compartilhar. Nossas vulnerabilidades são nossas maiores forças! E sua humanidade é que faz de você minha maior inspiração.

    OBS: Ignore os haters. Foque em nós, que te amamos e temos nossas vidas transformadas por você.

  8. Thais, jura que colocavam no feedback que você deveria considerar emagrecer? Nunca me passou pela cabeça escrever isso na avaliação de um palestrante/multiplicador!? Tenho uma trava também com a minha voz. Estou pensando em fazer aula de canto para aprimorar o uso do recurso vocal (teatro não é minha praia). Como você, sempre tive uma inclinação para a escrita, que me levou a prestar vestibular para Publicidade e para Jornalismo. Optei por Publicidade que, um ano depois, troquei por Administração de Empresas, por questões financeiras. Deu certo sob o ponto de vista material (embora eu não saiba como seria meu progresso financeiro se tivesse persistido na Comunicação – nada me garante que seria ruim), contudo, sei que essa troca deixou um pouco – ou muito – da Márcia no meio do caminho e, hoje, 30 anos depois, isso cobra um preço. Inclusive sob a forma de depressão. Como não é viável eu largar o que me mantém e mudar totalmente de rota, tenho pensado em voltar a escrever por hobby apenas. Preciso me centrar para isso e estou dando um pouco de tempo a mim mesma. Sua história é muito bonita e inspiradora. Keep going. Um beijo

  9. Que texto!!! Inspirador.
    Com certeza, vai me ajudar e ajudar muitas pessoas.

    Parabéns pelo seu trabalho… legado é mais importante do que o propósito, o seu legado já é demais!

  10. Olá Thais, gostaria de saber como fez para melhorar os pontos fortes ? fez cursos de oratória? como se aperfeiçou ? gostaria de umas dicas pois tbem tenho algumas dificuldades mas gostaria de melhorar os pontos fortes.
    Abraços

  11. Thaís, acompanho você há pelo menos uns 5 anos. E até dias atrás quando você falou dessa travinha nunca tinha reparado nisso, até porque cada um tem um jeito próprio de falar. Fiquei chocada com o fato de te pedirem pra emagrecer com a quantidade de conteúdo maravilhoso que você sempre passou.

    Fico feliz que você tenha superado essas coisas. Falar em público também sempre foi um desafio pra mim, por ser tímida. Na faculdade tive um professor que me ajudou muito com isso e no fim do curso eu nem parecia mais a mesma que gaguejou absurdamente na apresentação do primeiro trabalho. Ainda tenho muito a evoluir nessa questão, mas nada como o tempo.

  12. É texto de cabeceira. Pra gente reler e reler. Vou levar para sala de aula. Será tb inspiração para
    Meus alunos e alunas. Gratidão sempre!

  13. Nossa! Fiquei até emocionada com o texto! Muito obrigada! Eu tenho tanta vontade de conseguir essa sintonia em algum trabalho!! Esse texto me fez perceber que estou no caminho sim! Tudo de melhor p vc! E obrigada mais uma vez!

  14. Realmente adorei seu texto. E seu orientador tem razão: por exemplo eu tenho dificuldade em ter foco e mantenho durante os seus textos.

    Mas preciso falar: quem escreve que a palestrante precisa emagrecer em formulário de feedback, meu Deus. Como as pessoas não tem empatia.

    obrigada

  15. Ana Luisa de Oliveira Ribeiro

    Chorei!!! Vc já está cansada de saber da minha admiração e carinho por vc, mas esse texto e essa lição, arrasaram!!! Parabéns pela lucidez e pela clareza em nos expor algo tão intimo e que pode inspirar tantos. Obrigada e beijo

  16. Thaís!
    Vc é inspiração sempre. Te acompanho há tempos e me lembro de alguns desses momentos que vc citou. Texto para guardar na cabeceira da cama.
    Obrigada!

  17. Lindo, linda, maravilhoso, extraordinária!

    Ler isso só intensifica a vontade de ter estado presente no GTD Summit pra ver mais de perto toda essa experiência!

    Acredito muito no trabalho que você faz, no propósito que você exerce e como escolhe expressar isso. Ao menos ao meu caso, me é um grande guia, influência e associação (pensando nas leis mesmo) pra confiar também no que faço diariamente. Amo conhecer esses fragmentos da sua história e jornada que escolhe compartilhar.

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