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Veganismo

Bem, chegou o momento de escrever sobre isso no blog. Sei que é um assunto polêmico, mas tudo o que peço é respeito a esse meu espaço (que, afinal, é um blog pessoal) e respeito também nos comentários, para mim e para os outros.

Este post faz parte de uma série de posts onde estou escrevendo sobre estilo de vida, e você pode conferir todos os outros clicando aqui.

Faz, sinceramente, uns 20 anos que eu quero me tornar vegetariana. Quando eu era mais nova, contribuí durante muito tempo com a PETA e o Greenpeace e sempre fiquei revoltada sabendo como os animais são tratados pelos seres humanos – da indústria pecuária à medicina. O fato de o Paul McCartney ser vegetariano (e eu, apaixonada pelos Beatles) sempre foi uma “coisinha” que me cutucou ao longo dos anos. Ao mesmo tempo, sempre tive uma postura meio imatura e rebelde, no sentido de achar cool dizer coisas como “eu amo carne” etc.

(Mal sabia eu que isso não tinha nada de rebelde, pelo contrário. Nada é tão a favor do sistema quanto consumir algo que é mainstream.)

Em 2017, eu fiz a cirurgia bariátrica e, depois disso, não só o paladar muda bastante, como também alguns alimentos se tornam mais indigestos. A carne vermelha foi um desses alimentos. Eu só conseguia consumir se fosse moída, tipo em hambúrguer ou refogada. Mesmo assim, eu reduzi muito. Não comia nem duas vezes por semana, quando muito. Minha alimentação diária era à base de frango, ovos e peixe (porque eu também sempre adorei um restaurante japonês!).

Só que, com o passar do tempo, fui ficando muito enjoada do gosto e até o cheiro do frango. Comia apenas pela “obrigação nutricional”, o que é péssimo (acho que o momento da alimentação é sagrado e deve ser aproveitado com felicidade, e não com esse sentimento de obrigação). Acabei tirando o frango também e consumindo carnes, de modo geral, apenas duas ou três vezes por semana.

Em dezembro do ano passado, na ceia de Natal, eu passei mal comendo uma carne vermelha. Tive um entalo, coisa que nunca tinha tido após a cirurgia porque sou muito cuidadosa. Mas, na ceia, conversando, me distraindo, acabou acontecendo. Fiquei conversando e provavelmente engoli um pedaço sem mastigar direito, o que basicamente causou uma obstrução entre o meu estômago e o intestino delgado. Comecei a sentir uma dor muito forte, cada vez maior, até o ponto que meu sexto sentido me disse que era melhor ir para o hospital. Fui. Não apenas passei a noite de Natal internada como fiquei mais alguns dias, com sonda, foi horroroso, fora o medo de ter que passar por uma nova cirurgia. Não houve obstrução, por fim. Eu vomitei horrores antes mesmo de dar entrada na internação, e a partir daquele dia eu decidi que não comeria mais carne vermelha.

Em fevereiro, comecei a passar muito mal, de outra forma. Meu médico e eu, a princípio, achamos que fosse uma intoxicação alimentar. Vou resumir aqui para não ficar muito longo, mas eu passei quase TRÊS MESES nessa situação, quase beirando uma anemia e sem forças para trabalhar, sair de casa, nada, de tão desidratada. Foi uma bateria de exames (que, como vocês podem imaginar, tomam tempo pra caramba), passando super mal todos os dias. Até finalmente descobrir que o que eu tinha era uma alergia muito forte à lactose. Do nada. Tão forte que, se o produto for daqueles elaborados na mesma máquina que outro que não tenha, isso pode me dar uma reação (e geralmente dá). Isso impactou toda a minha vida, especialmente minha dedicação ao trabalho. Foram meses bem difíceis.

Em um primeiro momento, a solução óbvia era evitar derivados do leite e conseguir encontrar um remédio de lactase que equilibrasse a minha alimentação. Durante os meses seguintes, fiquei lutando contra a minha própria natureza tendo que ingerir remédios se quisesse comer sem passar mal (eu não gosto de tomar remédios).

Percebi também que comer fora de casa era um desafio. Nunca vou me esquecer do dia em que passei mal porque comi uma couve refogada, concluindo depois que isso aconteceu porque ela deve ter sido preparada com manteiga. Lembrei que não bastava não consumir queijos e alimentos com leite – mas que há muitos alimentos preparados com esses ingredientes! Lembro nitidamente de um dia em que fui ao Outback com a minha família depois disso, e todos os itens do cardápio eram sinalizados com uma gotinha, que simbolizava “preparado com leite”. (Ironicamente, o único prato do menu que não contém lactose é o prato da costela com molho barbecue!)

Naquela época, um aluno que também tinha alergia a lactose me deu uma dica: ir em restaurantes veganos. “Assim”, ele disse, “tenho certeza que nada ali vai ter leite, porque veganos não consomem nada de origem animal”. Achei que era uma ótima ideia, na verdade. Uma grande sacada! E foi o que eu comecei a fazer.

Isso foi maravilhoso porque, quando comecei a frequentar esses restaurantes, eu passei a ver a imensa riqueza de opções de comidas e preparos que existem quando você resolve não comer mais carne e qualquer alimento de origem animal. Meu pensamento óbvio foi: “caramba, realmente não tem necessidade nenhuma da gente comer qualquer coisa com carne”. E aí você começa a juntar os pontos dentro de você com outras questões muito urgentes mas que estavam incubadas, como a violência e a exploração animais.

Também desmistificou a ideia de que vegano só come mato. Tinha até pizza quatro queijos feita com ingredientes à base de plantas. Realmente um novo mundo se abriu para mim a partir dali.

Em paralelo a essa “descoberta gastronômica”, estava fazendo uma pesquisa muito aprofundada sobre a questão da lactose, conversando com médicos e outros profissionais da área, e uma coisa era consenso: o leite da vaca tinha que passar por tantas modificações e adições de elementos artificiais para ser industrializado no volume que existe hoje, que esse é o motivo de muitas pessoas estarem desenvolvendo alergia à lactose, infelizmente. Para passar dessa informação para outras que mostram como o leite é produzido, é um só pulo. E aí isso te abre os olhos para um mundo muito mais obscuro e triste, que vai além de você, ser humano, ter alergia à lactose. Envolve toda uma indústria de muito dinheiro, e animais sendo maltratados para a gente ter o alimento na nossa mesa.

Vale dizer que tudo isso também aconteceu este ano, com uma série de notícias sobre política e o meio-ambiente que estavam deixando todo mundo meio inconformado.

Naquele momento, eu ainda estava consumindo ovos (e adorava), até assistir um documentário chamado “Terráqueos” (tem no YouTube) e perceber o que eu estava financiando. Naquele momento, eu tomei a decisão de não mais compactuar com aquilo. Foi o dia que tomei a decisão de fazer minha transição para o veganismo.

Por uma incrível coincidência, foi na mesma semana que aconteceu aquilo que a imprensa chamou de “dia do fogo” – um dia de queimadas que acabou ocasionando um dia de céu super escuro aqui em São Paulo alguns dias depois. Inflamou-se cada vez mais a questão amazônica e os motivos das queimadas (gerar pasto). Minha revolta interna aumentou ainda mais e dali em diante minha decisão não tinha mais volta. Simplesmente decidi que não consumiria mais nada de origem ou exploração animal – não apenas na comida, mas qualquer outro produto (roupas, cosméticos, produtos de limpeza, uma infinidade de coisas). Quando você começa a pesquisar, vê que a alimentação é um indústria enorme, mas a de testes em animais, por exemplo, é tão grande quanto. Não tem como não ficar inconformado.

O veganismo é uma transição. Não acontece do dia para a noite, mas a decisão sim. Naquele momento, eu decidi que dali em diante eu ajustaria toda a minha vida de acordo com os meus princípios mais uma vez (que é basicamente o que eu faço com tudo).

O veganismo não diz respeito apenas à alimentação. É um estilo de vida. Não consumir alimentos de origem animal é o vegetarianismo. O vegano segue uma dieta vegetariana estrita. Quem não come carne, mas ainda consome leite, ovos, mel, é chamado de ovolactovegetariano. O veganismo inclui não apenas a alimentação, mas outros produtos, como bolsa de couro, por exemplo, ou usar um cosmético que tenha sido testado em animais. Por isso eu digo que é um processo. Eu ainda tenho shampoo, hidratante, peças de roupa com origem animal. Mas não vou comprar mais daqui em diante. E é isso.

Eu e meu leite vegetal preparado em casa. <3

Lembro de um dia em que fui à farmácia depois de iniciar essa transição e, só por curiosidade, dei uma olhada em alguns produtos para ver quais tinham aquele selo de “cruelty free”, o que significa que não foram testados em animais. Muito poucos. O que me veio à mente foi imaginar que todo o restante da farmácia, que é enorme, mas é apenas uma entre milhares de farmácias, existe essa imensidão de produtos testados em animais. Quando penso no mundo todo, e nessa febre que existe hoje com produtos de maquiagem e skin care… socorro!

Um fenômeno curioso que começa a ocorrer quando você declara que se tornou vegano é uma “encheção de saco” coletiva e completamente não solicitada de pessoas que se sentem no direito de questionar as suas escolhas, tão pessoais. Existe um estigma de que “vegano é chato”, e até concordo que seja. Mas são os chatos revoltados que mudam o mundo, no entanto. Então não me importo de estar deste lado. No entanto, acho as intervenções desrespeitosas e muito inconvenientes. Gente que nem me conhece me mandando mensagem ofensiva pacas – mas enfim, isso é a Internet, anyway.

Minha política pessoal, com as pessoas do meu convívio, tem sido a de só falar sobre veganismo se alguém me perguntar. Alguma amiga, algum aluno, alguém no trabalho. Na Internet, é meu espaço, então falo o que quiser. 🙂

Dei uma imensa sorte aqui em casa também porque, algumas semanas depois da minha “virada”, o youtuber Felipe Neto anunciou que tentaria virar vegetariano, o que reverberou nas redes sociais e gerou conversas. Então o assunto foi se tornando mais evidente por aqui. Não imponho (obviamente) minhas escolhas à minha família, mas sei que ela impacta totalmente na maneira como eles vêm consumindo os alimentos. O Paul já disse que quer parar de comer carne e meu marido tem diminuído também. Outro dia me disse que acredita que será vegano em algum momento. Minha mãe, que sempre amou os animais, viu nisso um incentivo para virar também. A gente tem trocado receitas. 🙂 Então tem sido um processo incrível e muito significativo para mim, pois além de tudo mostra a responsabilidade das minhas escolhas na minha família, especialmente na criação do Paul.

Existem muitos motivos para uma pessoa se tornar vegetariana. Alguns o fazem pela saúde, outros pela proteção ao meio-ambiente. Existem veganos que o fazem como maneira de protesto ao sistema capitalista. Mas, acima de tudo, o veganismo é sobre os animais. Sobre entender que estamos em um planeta convivendo juntos, e que nada nos dá o direito de superioridade, de achar que podemos controlar e matar os animais apenas pelo nosso “paladar” ou por conforto de ter um produto de beleza que deixa o nosso cabelo mais sedoso. É uma maneira de não compactuar com essa indústria de maldade. Não é uma causa que cuida de “tudo”. Existem muitas causas do mundo. Se cada um escolher uma, o mundo vai melhorando aos poucos. Escolha a sua, uma que você se identifique. E deixe os que estão lutando por outras lutarem. 😉

É claro que, por eu ter passado pela cirurgia bariátrica, preciso triplicar a minha atenção com relação aos nutrientes, além da suplementação de uma vitamina (B12), o que eu já fazia antes mesmo de me tornar vegana. Esse é um ponto importante pra todo mundo, aliás: não basta tirar a carne. Precisa substituir com alimentos nutritivos. Mas se você fizer acompanhamento médico direitinho e cuidar de perto da sua alimentação, perceberá que nunca comeu tão bem na vida. Hoje eu me alimento basicamente de comida natural, comprada na feira, e apenas 10% do que consumo vem de industrializados. Passei a me envolver mais com os processos, a cozinhar mais, enfim, estou curtindo pra caramba. Descobri que cozinhar é uma terapia, para mim. Além de tudo, economizo dinheiro, porque carne é caro. Gasto de 40 a 50 reais por semana com a minha alimentação.

Preparar e deixar marmitinhas prontas garante que você sempre tenha seu alimento mesmo na correria do dia a dia ou quando vai a lugares que não sabe se encontrará opções que você pode comer.

Outro lado bom de todo esse processo também é fazer novas amizades e se envolver com gente legal, do bem. Desde conhecidos que ficaram mais próximos até pessoas novas. Assim como a dona da mercearia, o dono do mercadinho de produtos naturais. Você acaba desenrolando as conversas porque troca dicas, receitas e fica sabendo sobre os eventos que você acaba querendo ir até para dar uma força. É todo um mundo consciente que se abre, com inúmeras possibilidades.

Além do acompanhamento médico, tenho seguido diversos canais no YouTube, lido livros e assistido documentários relacionados. Estou muito engajada!

No Budismo, eu aprendi a reforçar uma convicção que eu já tinha, de não-violência e de não prejudicar outros seres vivos sencientes. Me tornar vegana foi apenas mais um “encaixe”, mais uma forma coerente de fazer as coisas de acordo com os meus valores. Estou em transição e acredito que, como todo o resto, isso seja uma construção para toda a vida. Mas, como toda construção, você só precisa começar. 😉