Mantendo o foco durante o mestrado

Cada vez mais eu chego à conclusão de que deveria ter feito mestrado logo depois de me formar, e aí deixar o doutorado para quando tivesse mais experiência. Mas, mesmo assim, eu ainda acho que valeu a pena ter esperado um pouco mais para entender o assunto que eu gostaria de ter me aprofundado no mestrado, então foi muito acertado ter tido esse tempo para pensar. É que eu acho, sinceramente, que poderia ter “pensado” nisso antes. Mas tudo bem, paciência. As coisas vão indo bem – isso são apenas reflexões pessoais.

Eu comentei em outro post que eu comecei o mestrado um pouco afobada, querendo aproveitar “tudo”. Com pouco mais de um mês após o início do curso, eu posso dizer que consegui ajustar o meu foco, e quero compartilhar isso aqui no blog porque, se você estiver começando o seu mestrado ou estiver pensando nisso, pode ser que esta dica ajude. Não é uma dica – está mais para o relato de uma experiência – mas espero que ajude mesmo assim.

Vamos a algumas definições pessoais sobre os diferentes níveis de formação:

GRADUAÇÃO: Quando você faz um curso para ter uma profissão ou um conjunto de conhecimentos em uma determinada área. Pode ser que você não atue no mercado daquela profissão, mas a área, como um todo, certamente será um delineador da sua carreira. No meu caso, em primeiro lugar, Humanas. Depois, eu fui para Comunicação. Independente de me especializar em Jornalismo, Publicidade ou outra área relacionada, esse foi um foco importante e eu diria que decisivo na minha carreira. Porque, pensando a longo prazo, em uma vida acadêmica, essa coerência é importante. Aqui eu vejo como foi muito acertada a minha decisão pelo mestrado em Comunicação, e não em Ciências Sociais, como falarei adiante.

ESPECIALIZAÇÃO: Hoje, eu já não sei se faria uma especialização (pós-graduação latu senso) como eu fiz na época (2011-2012). Acho que já teria ido direto para o mestrado. Porém, lá atrás, lembro que fiz essa especialização porque não tinha muito interesse (ou não sabia que queria) na vida acadêmica em si. Eu queria uma especialização profissional mesmo. Fiz em Mídias Digitais. Isso também foi muito acertado porque, desde que comecei a trabalhar na minha área, sempre fiquei no Marketing Digital e na produção de conteúdo. Qualquer pós-graduação com esse tipo de foco teria sido legal para mim. Ter feito essa pós-graduação foi algo muito bom para o meu currículo e para a minha formação, porque aprendi coisas novas muito importantes, que também me ajudaram a despertar a vontade de virar professora logo em seguida.

MESTRADO: O mestrado é um curso que aprofunda os conhecimentos em uma área da sua graduação. O objeto de estudo da sua pesquisa será um tema que você quer ser “conhecido” e reconhecido na área. A ideia é escolher algo que você goste muito, seja intrigado(a) a respeito, para se aprofundar. Para fazer isso, você fará uma pesquisa – e a ideia aqui é te preparar não apenas para se aprofundar na área escolhida, o que te possibilitará lecionar nessa área futuramente, mas te preparar como pesquisador(a). No meu caso, eu fiquei muito em dúvida se iria para as Ciências Sociais ou se ficaria em Comunicação. Ter optado por Comunicação foi muito acertado. A área de pesquisa em Comunicação tem uma série de construções importantes a serem feitas, e acredito que eu possa contribuir mais do que se tivesse ido para Ciências Sociais. Meu objeto de pesquisa é a Midiatização, um tema forte hoje em Comunicação, e o farei com foco no trabalho. Então eu tenho essa frente maior, na verdade, que é Comunicação e Trabalho. Isso é importante porque delineará a minha área de estudo, de atuação, de especialização, e também o tipo de pesquisa que vou explorar depois, em um doutorado e pós-doc, ou até durante a vida inteira, eu acredito.

DOUTORADO: Oferece um conhecimento mais aprofundado do que o mestrado. A ideia é apresentar uma tese que traga algo novo, original, para o campo do saber (uma nova teoria, por exemplo), enquanto que a dissertação do mestrado é mais um estudo aprofundado de determinado campo, embasado em uma pesquisa. Eu ainda não decidi exatamente qual será o meu objeto de estudo do doutorado, apesar de ter algumas pistas e ideias (que vou capturando).

PÓS-DOC: Totalmente voltado para a pesquisa, visa resolver algum problema avançado e gerar publicações mais amadurecidas. Creio que só terei uma ideia melhor do que isso significa após a entrada no doutorado.

Como vocês podem ver, estou traçando uma linha do tempo a longo prazo para o que quero para a minha vida acadêmica como um todo. Posso não ter certeza dos objetos de estudo lá na frente, mas tenho uma ideia mais clara do propósito como um todo.

Bom, e por que estou contando tudo isso? Para explicar o que defini para o meu foco no mestrado nesses dois anos que estão em andamento.

Quando comecei o curso, eu estava muito afobada e querendo aproveitar ao máximo. Ainda quero, mas preciso ter foco para não desperdiçar tempo naquilo que não preciso aprofundar agora. Essa foi uma percepção MUITO importante e decisiva para os artigos que vou escolher escrever, as pesquisas que pretendo fazer, os eventos que vou participar etc.

Eu tenho que a minha grande área de pesquisa é Comunicação e Trabalho. Digo, para a vida. Então eu tenho este momento atual, que é um recorte de dois anos para o mestrado, em que fiz algumas escolhas (o objeto de estudo, a universidade, o orientador, o recorte empírico). Ter noção desse recorte é importante para aproveitá-lo da melhor maneira possível e também com o foco apropriado.

  • O objeto de estudo: Midiatização. Este é um objeto importante e que eu preciso ser craque porque me especializarei nisso. Serei referência, como mestre. Ponto. Então tenho que estudar, ler artigos, participar de eventos e seminários relacionados. Toda essa dedicação e esses estudos me formarão não apenas como professora e pesquisadora, mas servirão para todo o resto. Um estudo gera outro, e nenhum aprendizado se perde. Além de aprender muita coisa nova, eu preciso manter esse conhecimento atualizado. Então só esse objeto, por si mesmo, já gera uma demanda bem grandona de trabalho. Logo, esse foco atual é muito importante porque me dará base não apenas para a pesquisa no mestrado, como para todas as outras que eu venha a fazer. Eu vou participar (como ouvinte) de um evento agora em abril em uma universidade que tem grandes nomes nessa área, e me senti muito feliz por ter feito esse investimento (é em outro estado, vários dias).
  • A universidade: Cásper Líbero. A Cásper é referência em Comunicação, especialmente na graduação em Jornalismo. A área de pesquisa no Mestrado é Comunicação na Contemporaneidade, e a linha de pesquisa em que me encontro é a de Processos Midiáticos. Tudo isso é muito importante porque o campo da Comunicação é um campo que está sendo construído pelos pesquisadores. Eu sei que, em teoria, todos estão (rsrsrsrs), mas quem estuda Comunciação academicamente sabe do que estou falando. A Comunicação é considerada por muitos apenas “um braço” das Ciências Sociais e está lutando para se mostrar como campo por si só, então os pesquisadores têm se esforçado para cada vez mais trazer pesquisas relevantes nessa área. A Cásper é muito engajada nesse sentido e traz muitos eventos, seminários, estudos e palestras a respeito. Eu faço parte de um grupo de pesquisa com foco em Teorias da Comunicação / Epistemologia da Comunicação, que é coordenado pelo meu professor orientador, então esse tema também é meu foco no momento e o será por toda a vida, eu acredito. Acho que “conhecer bem todas as teorias e me engajar com essa construção” seja o foco que eu estou tentando descrever. Tudo isso me dará suporte como pesquisadora a longo prazo e também na minha formação como professora.
  • O orientador: Luis Mauro Sá Martino. Meu professor orientador tem uma trajetória que deve ser estudada e respeitada, e eu o escolhi por alguns motivos, certo? Pois bem, esses motivos devem estar claros e, para mim, é importante que eu reconheça o seu trabalho lendo os artigos que ele já publicou, lendo (na medida do possível) todos os seus livros, respeitando o que ele orienta com relação à minha pesquisa e aos artigos que eu escrevo durante o mestrado. Ele tem me ajudado muito a manter esse foco. Para mim, respeitar a trajetória do orientador é importante, até mesmo para eu saber como aproveitar o seu conhecimento para esse próprio cenário de dois anos durante o mestrado – leituras que devo ou não fazer, orientações para o todo mesmo. Se ele me falar que é bom participar de um seminário, por exemplo, vou estudar com carinho a possibilidade porque sei que, se ele está indicando, é importante. Assim como respeito muito a opinião dele quando ele fala que é melhor deixar algum evento ou assunto de lado no momento (isso é especialmente importante para mim, pois fico tendo ideias o tempo todo). O orientador está ali para te orientar mesmo, então é importante valorizar essas conversas.
  • O recorte empírico: Vou pesquisar a midiatização do fluxo do trabalho através dos aplicativos de produtividade. Vou trabalhar com mulheres que atuem na área de Comunicação em modelo PJ de contratação. Por quê? Porque já foi comprovado que as mulheres sofrem mais com a precarização do trabalho, e meu problema de pesquisa é justamente revisitar os diversos conceitos de midiatização para investigar se essa mudança no fluxo do trabalho tem influenciado nessa precarização. Então, aqui, eu tenho dois micro-temas importantes a serem estudados dentro da minha pesquisa: os aplicativos de produtividade e a precarização do trabalho das mulheres. Percebam que são dois campos que não são teoricamente da Comunicação (Tecnologia e Ciências Sociais), mas estão sendo trazidos para o meu olhar da Comunicação. Ter esse recorte empírico me ajuda como, em termos de foco? Qualquer outro trabalho de pesquisa menor que a minha dissertação que eu faça durante esses dois anos (ex: seminários, artigos), eu usarei esses dois micro-temas para não fugir muito do que estou estudando e não sair do foco. Pode parecer bem básico para quem já é pesquisador há algum tempo, mas eu achei genial como tem funcionado para mim. Por exemplo, vou submeter uns 4 ou 5 trabalhos este ano para eventos. Ter esse recorte empírico me ajuda com todos eles, para não perder tempo estudando coisas que não contribuirão com a minha pesquisa.

Agora, obviamente, a minha carreira não se resume aos dois anos de mestrado e ao foco acima. Como eu falei, tenho a frente maior, que é Comunicação e Trabalho. No entanto, neste momento, eu sei que preciso focar nos aspectos acima – que já são bastante coisa, e em um a mais que não citei: embasamentos clássicos tanto de Comunicação quanto de Sociologia do Trabalho. Revisitar Comunicação, que já estudo desde a graduação, e aprender Sociologia do Trabalho, que não foi meu foco na graduação. Então são estudos que vêm em paralelo, mas em ordem diferente de prioridade. Na prática, significa que, se eu tiver pouco tempo para estudar ou produzir trabalhos, vou priorizar na seguinte ordem:

  1. Midiatização
  2. Epistemologia, metodologia e teorias da Comunicação
  3. Sociologia do trabalho, aplicativos, precarização do trabalho feminino
  4. Ciências humanas e sociais no geral: política, sociedade, comunicação, trabalho, poder

Eu penso que um próximo passo será identificar as disciplinas que tenho interesse (e capacidade) para lecionar, o que pretendo fazer só a partir do quarto semestre do mestrado. Por enquanto o foco está bastante claro para mim, e assim seguimos.