Minha experiência com o COVID-19

Hoje é o meu dia 169 do isolamento social. Sim, eu marco diariamente, desde o dia em que iniciei minha quarentena, dia 12 de março. De lá para cá, meu marido faz as “saídas essenciais” – mercado, farmácia – e eu mesma saí poucas vezes. Mesmo assim, em algum momento, é possível que ele tenha se descuidado, ou eu, e acabamos nos contaminando.

Vejam só a importância de ter um modelo de registro como o Bullet Journal.

No dia 17 de julho, eu estava sentindo uma falta de ar muito estranha. Achei que fosse ansiedade. De qualquer maneira, liguei no 136 e informei meus sintomas. Fui orientada a ficar em casa e, caso piorasse, fosse ao hospital. Não tinha febre nem quaisquer dos outros sintomas do vírus.

Na semana seguinte, fiquei menstruada, o que sempre é um momento do mês complicado para mim, pois estou em uma transição hormonal. Na segunda (20), comecei a ter dor de cabeça. Só piorou ao longo da semana. Na quarta (22) e na quinta (23), eu passei os dias deitada, com muita dor, dores no corpo, tudo muito intenso e esquisito. Hoje fica fácil interpretar, mas naquele momento eu achei que fossem sintomas normais da minha menstruação, porque sempre fico assim meio “derrubada”, apesar de achar estranho estar com dores no corpo.

Na sexta, falei com as minhas terapeutas e ambas me perguntaram se eu descartava a possibilidade de ser COVID. Como eu estava em casa, não tinha pensado nisso. Conversei com o meu médico, ele ficou bastante preocupado e me pediu para fazer imediatamente o exame de sorologia – o que indicava que eu poderia estar infectada há mais de uma ou duas semanas, pelos sintomas.

Fiz o exame apenas no dia 3 de agosto, quando consegui um agendamento (fiz particular para o processo ser mais rápido). O resultado saiu em menos de dois dias, e deu como “reagente”. A interpretação é que eu ainda estava contaminada, pois meu corpo estava reagindo ao vírus. Imediatamente, me isolei em casa, pois não sabíamos se era apenas eu ou se os meus meninos também estavam.

É bem difícil porque, quando você sabe que você tem, tudo parece sintoma. Eu não tive febre em nenhum momento, nem perda de paladar ou olfato. Os dois sintomas mais esquisitos que senti, “fora do normal”, para mim, foram a falta de ar esquisita e as dores no corpo, como de uma gripe forte. Mas, tirando isso, coisas esparsas, como dor de cabeça, tosse leve e constipação. Como tenho sinusite, para mim esses eram simplesmente sintomas normais que aparecem em época de frio.

Quando paro para analisar, aquela semana de 17 a 24 de julho foi a pior de todas. Eu passei vários momentos daquela semana simplesmente deitada, sem forças. Nada que me preocupasse a ponto de querer ir para o hospital, pois eu achava que tinha a ver apenas com o meu ciclo menstrual. O fato é que coincidiram e isso fez com que tudo fosse mais intenso mesmo.

Recentemente, todos nós fizemos novamente a sorologia e tanto meu marido quanto o filhote deram negativo, sem reagentes e sem anticorpos. O meu continua reagente. A interpretação do meu médico, que atua no centro da coisa toda aqui em SP, é a de que provavelmente estamos todos imunes – pelo menos a esta cepa do vírus. Meu marido e filhote provavelmente pegaram, já se “curaram” e eu continuo reagente – as causas podem ser genéticas ou quaisquer outras. Ninguém sabe, tudo é muito novo e não passa de especulação com base na experiência chinesa e outras pelo mundo. Em um mês devo fazer um novo exame para ver como está a situação, mas ele mesmo, que atua em plantão de atendimento para o COVID-19, testou “reagente” todas as vezes também. O contágio é facílimo, pega-se em qualquer descuido – como provavelmente aconteceu conosco.

Sobre filhote e marido. Filhote foi totalmente assintomático (ainda bem). Marido teve mais sintomas do que eu. De fato, na mesma época em que eu estava ruim, ele teve sintomas também. Disse ter sido parecido com quando ele teve dengue. Muita dor no corpo, teve questões gastro intestinais, enjôo, dor de cabeça. Já melhorou, mas teve alguns dias em que fiquei com medo que ele tivesse que ir ao hospital.

Em um dos dias, antes de sair o primeiro resultado do exame, alguma coisa me dizia que eu deveria estar mesmo contaminada. Pratico meditação diariamente, yoga, e adquiri grande percepção do meu corpo como um todo ao longo dos últimos meses fazendo isso com uma constância e concentração maior. Em uma manhã, estava fazendo minha meditação, e senti minha respiração pesada. Eu já tive pneumonia mais de uma vez, e sei como é. Coloquei a mão sobre o meu peito enquanto respirava, e sentia o peito pesado. Acho que foi a única vez que tive medo. Imaginei que eu poderia piorar, naquele dia, mas felizmente isso não aconteceu.

A fadiga é um ponto muito esquisito. Claro que, como veio a frente fria em São Paulo logo na sequência, eu já não sei dizer que foi apenas questão do frio mesmo ou se um mix de todas as coisas, mas eu passei algumas semanas dormindo muito mais horas do que o normal. Geralmente, dormindo entre seis e oito horas toda noite eu fico nova em folha no dia seguinte. Estava dormindo 10, 11 horas. Por volta das 21h estava na cama e levantava bem depois do sol nascer, por volta das 7h ou 8h no máximo.

Eu tive tosse durante algum tempo (passou), mas ainda sinto a falta de ar. Acho que foi o sintoma mais acentuado. No sábado passado, tirei o dia de folga e fui inventar de reorganizar as minhas estantes de livros. Tive que parar na metade e guardar tudo meio de qualquer jeito porque fiquei bem ruinzinha. No dia seguinte, uma dor no corpo que parecia que tinham me batido com uma tábua de madeira nas pernas e nas costas, muito intensa.

O que o vírus me mostrou é que o corpo impõe limites que nem sempre só o emocional, o psicológico ou “a força de vontade” superam. Me considero uma pessoa bastante positiva e sempre ativa, mas sei quando é o momento de respeitar o meu corpo e fazer o que precisa ser feito, acima de tudo.

Exatamente hoje, sábado, fui dar a volta no quarteirão com o nosso cachorrinho e eu sinto que é forçar a barra ainda algumas vezes. Evito subidas e caminhadas mais forçadas, porque eu sinto a respiração pesada. Meu marido, por outro lado, se sente muito bem e não tem falta de ar. É bem estranha essa variedade de sintomas porque você fica meio sem referência, mas sei que é comum.

O mais difícil para mim é ter que lidar com a preocupação, o medo de piorar e ter que ir para o hospital, a ansiedade por não saber o que vai acontecer. Respeitar meu corpo, descansar, dormir mais, cuidar da alimentação, conversar constantemente com meus médicos, diminuir o ritmo de trabalho e agendamentos, alternar mais atividade com descanso, enfim – tudo isso tem sido essencial. A recuperação é lenta e não se sabe quais são as sequelas do pós COVID, especialmente porque há casos de reinfecção e sequelas diferentes pelo mundo. Temos alguns indicativos, como por exemplo: pouca exposição ao vírus provavelmente leva a sintomas mais leves. Que eu acho que foi o que aconteceu conosco. De qualquer maneira, cada pessoa reage de um jeito, e cada pessoa terá um pós-COVID diferente.

Agora, a orientação é continuarmos em casa, pois é provável que a gente não seja mais foco de contágio, mas não sabemos ainda sobre reinfecção ou sintomas pós que podem ser agravados no caso de mais exposição ao vírus.

Eu sinceramente não me sinto doente no momento, mas também não me sinto 100% bem. Ainda acho que leva um tempo para me recuperar totalmente. Me sinto mais cansada que o normal depois de um dia de trabalho e a falta de ar é o mais chato e preocupante, digno de prestar atenção. Tudo isso se reflete nas minhas atividades de modo geral, então eu já estou entrando no mês de setembro com algumas perspectivas de deixar algumas coisas de lado, pelo menos durante algum tempo. Sem culpa. Faz parte.

Mas assim, não se preocupem. Estou bem. Estou me recuperando, sempre em casa, tranquila, com paz mental e no coração, e sempre contente e otimista. Só posso demorar para “postar aquele texto”, “aprovar o comentário”, “fazer aquele vídeo”, “aprovar a entrada no grupo”, “responder um e-mail”. Tenho muitas frentes de trabalho, por trabalhar com Internet, e não existe milagre da multiplicação de braços para responder todo mundo e fazer tudo como eu gostaria. Priorizo sempre os meus alunos, diariamente, em termos de trabalho, e a minha família, além de mim.

Outro dia eu postei sobre a percepção de que talvez sejamos vistos como egoístas quando tomamos decisões pessoais a cerca da nossa produtividade, ou como quando a gente escolhe usar o nosso tempo de uma maneira diferente, mais lenta, na contramão do que comumente as pessoas fazem. Todos nós convivemos com outros seres humanos, geramos relacionamentos. Acima de qualquer decisão, sempre deve haver o respeito, e o entendimento de que o tempo de cada um é diferente. E que bom. Continuo firme e forte por aqui nessa convicção porque ela é baseada em crenças corretas.