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“Mais forte do que nunca” (Brené Brown, 2016)

Nesse momento exato da quarentena, eu estou em uma vibe de ler alguns livros com foco em ficar bem mentalmente e reler livros que eu li em outros momentos da minha vida e que acredito que essa releitura será útil agora. Uma dessas releituras é o livro da Brené Brown, “Mais forte do que nunca”, que eu li pela primeira vez em 2016 – coincidentemente em um período da minha vida que tive um desafio profissional bem difícil e a leitura me ajudou bastante na época. Acabei por ler todos os livros da Brené, e recomendo a leitura até para contextualizar muito do que defendo por aqui sobre produtividade compassiva. Ela também tem várias palestras e vídeos bacanas no YouTube e um doc na Netflix. Pode valer a pena assistir tudo caso você se identifique com o trabalho dela e queira fazer uma “imersão”.

Minha ideia é ir fazendo resenhas desses livros que estou lendo aqui no blog, aos poucos, então hoje vou falar sobre este livro específico da Brené.

Pontos importantes que me levaram a profundas reflexões durante a releitura:

  • Logo no início do livro ela traz algumas “regras” para dar a volta por cima. Eu voltei nessa parte depois de reler o livro inteiro e acredito que sejam um bom resumo de tudo o que ela traz ao longo da leitura. Por exemplo: a importância de compreender o seu estado de coragem, em que ponto da jornada você está, o que você está aplicando de conhecimento do que aprende ao longo da vida, como funciona o processo de “dar a volta por cima”, como funciona o sofrimento etc.
  • Ela faz uma analogia muito interessante com “a jornada do herói” do Joseph Campbell, ensinando como podemos identificar as diferentes histórias que vivemos na vida e que pode ajudar você estruturar os seus acontecimentos dentro de uma determinada narrativa até mesmo para se entender melhor. Aliás, compartilhei isso com a minha terapeuta e ela amou demais a ideia – mais uma convencida a ler o livro. rsrs
  • O processo de dar a volta por cima tem três atos: reconhecer que está sentindo algo, ser honesta/o consigo mesma/o sobre como se sente e então fazer uma espécie de “revolução pessoal” a respeito do que está acontecendo. Não há uma dica fácil e rápida aqui – o livro todo se trata desse processo. 😉 Mas ter uma “receita” que nos permita identificar onde estamos dentro da nossa narrativa pode ser útil.
  • Eu adoro quando ela fala que, a partir do momento que reconhecemos que estamos em uma história, podemos escolher como queremos nos sentir no final dela. Pode parecer um pouco “auto-ajuda demais”, mas faz sentido. Porque, a partir desse exercício de visualização, você pode escolher como agir a fim de obter tal resultado, que muitas vezes pode ser apenas interno e não algo que dependa de outras pessoas.
  • É honesto assumir que falta clareza em algum ponto da sua história. Tá tudo bem. Talvez você não saiba o que aconteceu ou não reconheceu ainda. Mas só de identificar isso pode te ajudar a ter mais clareza do processo em si.
  • Um dos pontos mais importantes de quando eu li esse livro pela primeira vez, lá em 2016, foi quando ela comenta sobre a gente impôr limites. “Como esperar que as pessoas valorizem nosso trabalho quando não nos valorizamos o bastante para estabelecer e manter limites desconfortáveis?” Eu estava passando por uma situação bem relacionada a isso na época, profissionalmente falando, e foi a partir dali que passei a estabelecer limites para manter a minha integridade e saúde mental. Inevitavelmente você acaba comprando algumas brigas. Quatro anos depois, posso dizer que é muito difícil você abrir mão dessa escolha a partir do momento que passa a priorizá-la sempre. Você já nem sabe mais como viver sem estabelecer limites. Foi fundamental para eu me reerguer e dar a volta por cima, como ela diz.
  • Outra frase poderosa que ela traz é: ‘não julgamos ninguém quando estamos bem conosco”. Bem, isso foi uma coisa que aprendi em anos de terapia também. Quando alguém me deixa um comentário na Internet dizendo “você é muito burra!”, aquilo não me ofende, a não ser que, no fundo, eu me considere burra sim. Então eu preciso entender a minha relação com esse sentimento, mas não com a percepção que a pessoa tem, porque o que ela pensa sobre mim é problema exclusivamente dela. A partir do momento em que eu esclareci mentalmente e estou em paz comigo mesmo sobre ser burra ou não (é apenas um exemplo), esse tipo de mensagem não vai me afetar. Serve para tudo na vida e é poderoso pacas. O que uma pessoa pensa sobre mim muitas vezes revela mais a percepção dela, a sua ignorância e até mesmo traços de caráter que façam com que ela aja daquela maneira. Não sou eu. É algo que apenas ela deve lidar e resolver se for um problema para ela em questão. Eu não preciso fazer nada a respeito.
  • A questão dos limites nos ajuda a respeitar o que sentimos. E assim, sinceramente, podemos estar errados. Podemos nós termos sido a pessoa que fez o julgamento, pois todo mundo erra. A questão é que, quando você se relaciona com outra pessoa, e o relacionamento de alguma maneira te magoa, é porque você tem algo dentro de você que você precisa resolver sozinha/o – não colocar na conta do outro. E tá tudo bem, esta é uma questão. A outra questão é: como você vai deixar que a outra pessoa se relacione com você. É ter coragem de virar para o fulano e dizer: “meu amigo, eu me importo com você, o que você está dizendo é importante e vou considerar, mas precisamos estabelecer limites sobre o que é aceitável ou não nesse relacionamento. e eu não acho aceitável você me dizer esse tipo de coisa. peço que não o faça mais”. É sincero, é honesto, é corajoso.
  • “Expectativas são ressentimentos esperando para acontecer.” Reflita sobre essa frase. 😉
  • Sobre corações partidos. Um coração partido não necessariamente precisa acontecer dentro de um relacionamento amoroso. Você pode ter o coração partido pelo seu chefe, quando ele te prometeu uma coisa e não fez, nem te avisou a respeito da decisão dele, e você se sentiu trouxa. A Brené traz: “só quem pode partir meu coração é alguém a quem eu tenha dado”. Mais uma vez, a questão dos limites. Então não é tirar a responsabilidade do outro – é que você não pode se responsabilizar pelo outro! Você só pode se responsabilizar por você mesma/o! Logo, você pega esse sentimento e tenta entender o que pode tirar dele. Como mudar no futuro? Como entender o que aconteceu? Por que você agiu assim? Etc.
  • Ela escreve sobre o luto também que, assim como no tópico anterior, não diz respeito a uma situação específica (como a morte de alguém), mas pode ser referente à morte de uma situação, ser mandado embora do emprego, ser despejado, enfim, o luto de alguma coisa. E o que ela traz como prática reconfortante é que o luto deve ser respeitado, leva tempo, mas também demanda uma reorganização de todas as partes. E você precisa respeitar esse processo – contar essa nova história do seu luto – e entender como você quer se sentir ao final dela. Isso nos ajuda a nos conectarmos com nós mesmos mesmo quando sentimos que a desconexão está acontecendo dia após dia.
  • Ela fala sobre a dificuldade de se perdoar algo, alguém, uma situação. Porque é sim muito difícil. Mas que precisamos aceitar que, se aceitarmos perdoar, vamos escolher a dor. Precisamos aceitar que vai doer. Algo tem que morrer para você perdoar. E o perdão é tão difícil justamente porque envolve a morte e o luto de situações anteriores que poderiam ser muito boas. Mas o luto é algo necessário de ser vivido quando alguém ou algo morre. Você precisa passar por essa etapa e concluir a história.
  • Na sua família, com os seus amigos, com os seus colegas de trabalho, tudo o que você faz e a maneira como você encara as coisas é um aprendizado para eles. Seus filhos percebem quando algo não está legal. Se você se permitir aceitar essa vulnerabilidade e deixá-la existir como parte da cura, vira uma relação muito mais honesta e gera mais confiança, pois você não criou uma aura de perfeição que poderia afastar as pessoas de você. Ela tem um livro recém lançado sobre esse assunto de liderança compassiva.
  • Adorei a noção que ela traz sobre algumas reações de desequilíbrio que podemos ter durante situações de dificuldade, como hiperfuncionar ou subfuncionar, e acho que isso super conversa com o que está acontecendo durante a quarentena. Tem pessoas que reagem a uma situação difícil querendo tomar o controle de tudo, fazer mil coisas, enquanto outras ficam completamente paradas, sem conseguir agir. Você só precisa se conhecer para entender como agir para se sentir melhor momento a momento.

Bom, são realmente muitas reflexões interessantes. Eu sequer teria a pretensão de trazer todas para cá, mas sim dar um gostinho.

Por que essa é um leitura interessante para fazer durante a quarentena, do meu ponto de vista? Não é um livro sobre confinamento. É um livro sobre abraçar sua vulnerabilidade como parte de quem você é e aprender a lidar com as dificuldades de maneira mais honesta com você mesma/o e os seus relacionamentos. Um livro para ler quando não há esperança. Quando não conseguimos ter perspectiva. Quando o fracasso parece eminente. Quando as dificuldades parecem muito maiores que qualquer chance de “vitória”. Um livro que ensina a gente a aprender a contar sua própria história, especialmente com as dificuldades, que talvez até estejam deixando sua visão a respeito de si mesmo/a um pouco nebulosa. .

“Vulnerabilidade não é ganhar ou perder; é ter a coragem de se mostrar e ser visto quando não se tem controle algum sobre o resultado.”

Sempre estamos passando por processos na vida. O segredo está em identificar em que fase você está de cada processo e aprender a encarar as lições, os aprendizados, os desafios. O livro pode ser bastante inspirador sobre como encarar um momento difícil como esse que a gente está vivendo. Mergulhamos no autoconhecimento, nas nossas emoções, procuramos entender o desconforto e a lidar com ele em vez de evitar. O livro traz várias histórias pessoais de resiliência, o que faz com que a gente gere um vínculo bacana com ela (a autora) e fique inspirado a ter mais coragem.

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Autor

9 comentários em ““Mais forte do que nunca” (Brené Brown, 2016)”

  1. Míriam Medeiros Strack

    Amo a Brené. Já iniciei A Arte da Imperfeição três vezes e nunca cheguei a concluir porque só o pedaço do início já mexe tanto que comigo, que preciso parar pra absorver e colocar em prática. Muito bom!

  2. Respeitar o luto… há 7 anos atrás eu pedi demissão de uma empresa que eu amava, cuidava como se fosse minha e porque não soube estabelecer certos limites, me coloquei em uma situação em que quase cometi um crime. Digo me coloquei, porque eu poderia sim ter dito não ao que me foi solicitado. Só agora, depois de todos esses anos, depois de tantas escolhas confusas, tomei consciência que aquela decisão (aceitar agir de maneira antiética) afetava como eu me via, como eu me enxergava como pessoa e foi necessário viver o luto daquela pessoa, para que eu conseguisse me enxergar como alguém que pode agir diferente se for colocada novamente nessa situação. Foi um presente vir aqui e ler sobre esse livro. Obrigada, Thais e desculpe-me pelo tamanho do comentário, quase um desabafo.

  3. Escolha perfeita pra iniciar esta serie de posts, Thais! A Brené Brown é ótima mesmo, seja como escritora, pesquisadora ou storyteller.
    Para quem deseja se aprofundar ainda mais sobre o trabalho dela gostaria de também acrescentar o podcast “Unlocking US”, o qual foi por ela lançado recentemente e está disponível no Spotify, e recomendar a visita ao site oficial dela (https://brenebrown.com) que além de conter um apanhando geral dos inúmeros trabalhos da Brené, contém também a biografia dela através de fotos que, por si só, já vale a visita ao site.

  4. Oi Thais!

    Quando você postou que estava lendo esse livro, marquei minha terapeuta na postagem, pois dias antes estávamos falando sobre minhas escolhas de leitura e tudo que estava sendo falado na terapia nos últimos tempos casava muito com o que a Brené leva nos livros dela, e minha terapeuta havia me recomendado ler o livro A coragem de ser imperfeito em uma delas.

    Agora, que você postou a resenha, além de sentir mais vontade de conhecer o trabalho da Brené, fico mais feliz de ver que muitos pontos que você colocou eu tenho conversado e aprofundado na terapia, e que tudo vai se encaixando…

    Até recomendei esse post à terapeuta, justamente porque acho que a leitura, apesar de ser uma resenha, nos faz refletir muito…

    Mais um texto maravilhoso e claro nesse tempo turvo que vivemos…

    Eu também optei por ler livros sobre inteligência e estado mental na quarentena. Comprei o Ikigai recentemente. Mas estou lendo o “12 regras para a vida” do Jordan Peterson… maravilhoso também, apesar de denso.

    Um beijo.

    Ps.: se puder te dar uma dica como leitora, o outro modelo do blog estava mais fácil de acessar e visualizar os tópicos. Mas há quem goste assim também…

    1. Oi Evelyn, tudo bem? Obrigada pelo comentário. Por favor, verifique o aviso que temos postado diariamente sobre o blog estar em manutenção. tivemos um super problema no servidor e, apenas quando for resolvido, poderemos pensar em mexer no layout. Está um provisório, apenas para o blog não ficar fora do ar. Desculpe o incômodo.

  5. Pingback: Livros lidos no primeiro semestre de 2020 – vida organizada

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