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Cuidando da saúde financeira da empresa

Um tópico óbvio que está preocupando todo mundo é a questão financeira em meio a tudo o que estamos passando. Especialmente empresários, então meu post de hoje é para compartilhar um pouco sobre como estou fazendo.

Para quem é novo por aqui ou ainda não me conhece muito, prazer, meu nome é Thais Godinho, sou escritora, empresária, professora, mãe de um menino de 10 anos e, como praticamente todo mundo, tenho mil coisas para lidar e ainda por cima tendo equilíbrio para gerenciar todas elas. De todas essas práticas nasceu este blog justamente.

Ano passado, eu enfrentei uma série de desafios pessoais que impactaram a minha empresa. Fiquei mal de saúde durante uns oito dos 12 meses do ano de 2019, sem tirar nada além do pró-labore da empresa, para segurar os salários e as despesas que tínhamos. Em algum momento, eu precisei repensar o escopo do meu trabalho porque eu não estava conseguindo trabalhar naquele modelo de eventos e cursos viajando o Brasil e exterior. Iniciei esse planejamento para, em 2020, entrar o ano trabalhando exclusivamente online, em todas as minhas iniciativas.

Isso exigiu planejamento, redução de faturamento dos eventos presenciais (que eu fiz até dezembro, cumprindo as datas que eu já tinha prometido a todos) e redução da equipe também. Tínhamos uma sala para cursos, que fechei, pois meu foco seria exatamente no online e não havia por que manter a sala. Eu também reduzi gastos na minha vida pessoal, de modo que eu precisasse de menos dinheiro para viver o estilo de vida com mais qualidade que eu queria construir, e que incluía meu trabalho.

Uma das maiores lições que aprendi no ano passado é que você deve se preparar para crescer como empresário, mas que nem sempre crescimento significa aumentar equipe, escopo de trabalho e iniciativas. Você pode crescer como autônomo, e em determinado momento eu decidi que esse deveria ser o meu foco. Eu não queria ter uma empresa grande, com equipe grande, altos custos fixos, mas um negócio gerenciável e que me proporcionasse qualidade de vida, além de poder de criatividade para as coisas que eu queria fazer.

Além de poder crescer de maneira saudável, você tem que se planejar para reduzir de maneira saudável também, se necessário. E você não pode se sentir mal ou frustrado por conta disso. Gerenciar é isso. É realocar recursos e reajustar planos o tempo todo. No papel de empresários, somos responsáveis pelas vidas daqueles que trabalham conosco, então o planejamento é a maior forma de respeito que você pode ter com as pessoas, pois consegue avisá-las sobre o que está acontecendo e para onde a empresa está caminhando.

Eu entrei em 2018 abraçando uma série de iniciativas profissionais que faziam sentido na época para mim, e isso demandava crescimento de equipe, de espaço, entre outros investimentos. Deu certo e foi uma ótima experiência, mas apenas vivendo-a eu puder aprender o que queria para a minha vida profissional (e, especialmente, o que eu não queria).

Ao longo do ano passado, eu tomei algumas decisões importantes para a minha vida como um todo. A primeira delas, que eu já até compartilhei em outro post, há alguns dias, é que eu queria reduzir os custos da minha vida de maneira geral para precisar de menos dinheiro mensalmente para viver. Isso tem a ver com independência financeira, guardar dinheiro para a velhice e desenvolver a habilidade de consumo sustentável.

Como eu faria uma mudança grande no meu escopo de trabalho (a partir de janeiro 2020, eu trabalharia apenas com iniciativas online, o que representaria um corte de faturamento dos serviços presenciais), eu estudei com atenção todos os custos que eu poderia reduzir. E foi ÓTIMO fazer isso. Uma frase que ouvi uma vez e que tem total razão é que custo é que nem unha – se você não cortar sempre, cresce rápido e você nem vê direito. Reduzir os custos me fez ter mais tranquilidade com relação ao trabalho em si.

Quando entramos em 2020, eu estava confiante e com um fluxo de caixa bacana que garantiria a saúde da empresa durante o ano. Como todo mundo, não esperava que, em março, estaria em quarentena. Quando aconteceu, eu recebi muitas mensagens de colegas e amigos dizendo como foi acertada a minha mudança para o online – e eu fiquei feliz por sim, ter sido acertado, e confiante de que deveria tê-lo feito há mais tempo. Mas tudo bem, as coisas aconteceram como aconteceram, e estou satisfeita com a maneira como aconteceu.

Uma outra coisa que aprendi nos últimos anos e que fez toda diferença para mim foi: fluxo de caixa é o que faz uma empresa quebrar ou não. E seu foco deve ser em construir um fluxo de caixa para seis meses, depois um ano, depois dois anos… e, se quiser contratar alguém, tem que ter a garantia de pelo menos um ano de salário pago além desse fluxo de caixa para fazer a coisa toda com responsabilidade. Reduzir meus custos de vida garantiu que eu conseguisse trabalhar e investir na empresa sem tirar lucro algum na maior parte do tempo. O pró-labore, menor que muito salário por aí (três vezes menor que o meu salário na última empresa que trabalhei) cobria as minhas contas básicas pessoais (escola do Paul, luz, água, internet). Eu sempre fui muito consciente com relação a isso e foi o que manteve a minha empresa nos últimos anos e agora.

Por isso, me corta o coração ver empresas mandando funcionários embora depois de menos de um mês de quarentena. Entendo que nem todo mundo consiga ter esse fluxo de caixa, mas eu trabalhei durante quatro anos sem ter funcionário porque eu não tinha fluxo de caixa para contratar alguém. Do meu ponto de vista, contratar sem fluxo de caixa é querer crescer sem estar preparado. “Ah Thais, mas no meu caso, eu preciso ter funcionário para o modelo de negócios que eu tenho. Uma padaria, por exemplo.”. Então, mas qualquer curso do SEBRAE ensina a importância do planejamento financeiro para a abertura de um negócio e a primeira lição é sobre fluxo de caixa para sustentar a empresa enquanto recupera o investimento. Se o empresário quer abrir um negócio sem isso, ele tem que saber o risco que está correndo ou buscar um negócio que não demande esse investimento, geralmente na prestação de serviços.

A realidade é que muitas vezes o empresário brasileiro abre um negócio sem planejamento e apenas pensando no faturamento mensal, misturando despesas pessoais com as da empresa, e acaba embananando tudo. Isso não sou eu que falo, e sim as pesquisas diversas do SEBRAE e outros lugares. Outra realidade comum é a do profissional que é demitido e precisa se virar para “empreender”. Eu sei que existem dificuldades – lembrem-se que meu objeto de estudo é a sociologia do trabalho e a comunicação. 😉 Mas se uma pessoa precisa viver de bicos, empreender, etc, ela deve buscar maneiras de fazer isso que não envolvam investimentos arriscados que talvez ela não consiga manter.

Sei que é uma realidade difícil e que agora também não é o momento de apontar dedos – só acho que é um bom momento para todos nós, como empresários, olharmos para dentro e identificar melhorias.

Se alguém disser que tem a resposta certa ou a solução para as profissões e para os empresários no momento, eu diria que essa pessoa é maluca. Estamos passando por uma situação que nunca passamos antes, como humanidade. Sim, tivemos outras crises e pandemias, mas hoje temos a Internet e outros avanços tecnológicos. É diferente. Os desafios e as possibilidades são outros.

Para o meu trabalho, o que tem funcionado é:

  • reduzir custos, sempre;
  • priorizar o fluxo de caixa;
  • não tirar qualquer lucro da empresa enquanto priorizo o fluxo de caixa;
  • reduzir custos pessoais para não depender da retirada de lucro;
  • melhorar processos nos produtos e serviços já existentes;
  • reorganizar a projeção de faturamento levando em conta o público consumidor que está mudando sua cultura de consumo;
  • ter integridade ao vender qualquer produto ou serviço;
  • oferecer apenas aquilo que as pessoas estão realmente precisando no momento e jamais “empurrar” coisas para as pessoas apenas porque você tem que vender (isso eu já fazia antes, mas agora eu quero reforçar isso porque recebo cada e-mail marketing que dá vontade de chorar com a falta de noção!);
  • oferecer valor sem esperar compra em troca, porque a contribuição com o mundo através do que você considera seu trabalho vai (ou deveria ir) muito além do faturamento mensal – ele é consequência.

Independente da situação, as pessoas continuam precisando de coisas. Eu continuo precisando comprar comida, ter internet em casa, contratar a prestação de serviços diversos. A questão é: que solução você como empresário está trazendo para as pessoas nesse momento? Repense seu negócio para poder se reinventar. Talvez envolva mudar de área, o que é o mais difícil dos cenários, mas não é impossível. Talvez envolva apenas reajustar o que você já faz. Mantenha-se atualizado/a e com o foco sempre no que for melhor para os seus clientes, e você terá faturamento, mesmo que menor.

Outra parte muito importante é cobrar do Governo (não apenas do presidente, mas dos deputados, senadores, prefeitos, sub-prefeitos, vereadores, a galera mão na massa mesmo) providências que facilitem a vida dos empresários, como crédito a juros mais baixos, negociação com os bancos e outros. Não é justo o pequeno e o médio empresário pagarem uma conta que não é deles, mesmo porque sabemos que as pequenas empresas que geram a maior quantidade de empregos no Brasil. Lute pelos seus direitos.

Não poderia encerrar esse post sem citar a questão mental também. Recomponha-se. Permita-se sentir preocupação, desesperança, tristeza, arrependimento, raiva, o que for, mas não alimente esses sentimentos, e sim sentimentos bons, que te colocam pra frente, fazem você ser criativo/a e ter as boas ideias que te levaram a criar o seu negócio. Ouça o seu cliente. Pergunte o que ele precisa. Você terá ideias. Você vai ver.

Eu também creio que, aos poucos, o mundo todo (incluindo o Brasil) redescubra novas maneiras de voltar a circular com segurança e seguindo protocolos de higiene que garantam a saúde de todos os envolvidos, assim como redesenhe processos e trabalhos que possam ser realizados de maneira remota ou virtualmente.

Espero que o post tenha ajudado. Não sou especialista em finanças empresariais, mas tenho experiência como empresária e fiz uma transição de modelo de trabalho que muitos hoje estão fazendo às pressas. Então, como eu puder ajudar, ficarei feliz por fazê-lo. Se tiver algum tópico específico relacionado que você gostaria de me perguntar, pode deixar a pergunta nos comentários. Obrigada.

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15 comentários em “Cuidando da saúde financeira da empresa”

  1. Thais, me senti especialmente tocada por este post. Sou pequena empresária e tivemos toda esta preocupação em não demitir ninguém, apesar de ainda não termos tido viabilidade de um caixa com garantia de 1 ano de salário. Costumo dizer que, em muitos momentos, trocamos a roda do avião com ele voando. Não tiramos praticamente nada pra nós. Investimos muito do salário do meu esposo na empresa, por muito tempo, e há apenas 4 meses começamos a tirar um pró-labore para mim, 4x menor do que meu último salário como contratada. Diante da realidade da pandemia, tivemos que utilizar do recurso do governo de suspender o contrato de trabalho de 50% da equipe como forma de viabilizar a empresa. Mas demitir continua não sendo uma opção. Reduzimos nosso consumo em casa para poder bancar a empresa. As coisas ainda se misturam, mas evoluindo. Começamos com R$1000,00 negativos e hoje temos uma equipe, então acredito ferozmente que, apesar de não ser o caminho mais adequado, é uma linda jornada. Enfim, um desabafo, rs. Te acompanho há mais de uma década e por algum motivo precisava te contar isso. Abraços!

  2. Oi Thais!
    Eu tô naquele limbo de ter empresa (com CNPJ e tudo) e ser autônoma solo, que me deixa meio perdida em como agir. Com essa crise toda da Covid, baixei de graça da Amazon o ebook Finanças para Autônomos do Eduardo Amuri e achei a leitura bem tranquila para quem tem zero familiaridade com a área. Tenho procurado estudar e repensar o meu escopo de trabalho (isso não é de agora), mas a crise acabou tornando isso mais necessário. Então se tiver sugestão de mais material de estudo, seria bem bacana. =)

    1. Reforço o comentário do dela, no sentido de seguir esse autor nas redes sociais e ler seu livro. É o autor de finanças mais de humanas que eu conheço. Adoro o modo como ele aborda os temas.

  3. “Que solução você como empresário está trazendo para as pessoas nesse momento? Repense seu negócio para poder se reinventar.”
    Excelente reflexão para todos nós como profissionais e como cidadãos!

  4. Obrigada por compartilhar, Thais!

    Gostei muito do texto e da forma lúcida que você aborda pontos complexos. Me deixou em choque também ver como as finanças de empresas – grandes, médias ou pequenas – são tão frágeis, todos se beneficiariam deste tipo de planejamento.

    Para mim, estou seguindo os mesmos princípios em minhas finanças pessoais, o que tem sido um ponto de tranquilidade no meio de tudo isso. Dessa forma consigo ajudar mais também outras pessoas.

    Espero que continuem todos bem por aí, abraços!

  5. Oi Thaís! Adorei o post. Sou pequena empresária também e adorei todo o conteúdo! Acho maravilhoso que faça mais e mais. Pode ser até um novo foco do vida organizada! Parabéns e por aqui quero mais!

  6. Thaís, sou leitora do blog desde 2012 é a primeira vez que faço aqui um comentário (não gosto muito, confesso), mas acredito ser este o texto mais extraordinário e oportuno de todos os que já fez até aqui.

  7. Post ótimo! Porém, ainda um tanto utópico, sabendo da realidade do país com a maior parte dos empregos sendo gerados por pequenas e médias empresas, que competem com as grandes para se manter… então lidar com a questão do fluxo de caixa (sem nem contar que brasileiro é tipicamente um povo que gosta de viver no vermelho, então não consegue-se contar que vender seja receber posteriormente),… bem complicado.

    No entanto, quando se estuda Administração (me incluo aqui), você entende que na parte de Patrimônio Líquido, tem-se a parte das Reservas de Lucro, que talvez chegue próximo ao que você chama de fluxo de caixa… contabilmente falando vejo uma diferença aí… fluxo de caixa seria ter o dinheiro ali, no caixa, com disponibilidade. Já as reservas seriam uma ponta para que isso tudo funcione… só que o que noto é que o PL na parte de reservas de lucro só existe “na teoria”, na prática o dinheiro some com retiradas de lucro constantes, porque as pequenas e médias acabam fazendo isso para que seus donos sobrevivam… mas enfim…

    Como você também bem ponderou, não é justo que as empresas em menos de 1 mês de quarentena tenha de ouvir de seus governantes, que mesmo pagando 5 meses de trabalho em imposto, eles não consigam fazer muito por sua população. O que enxergo nisso tudo é que precisamos rever quem estamos colocando para nos governar e como nos GOVERNAMOS. Enquanto pessoas e enquanto empresas.

  8. Seus textos são ricos de conteúdo. A cada dia aprendo mais com as suas experiências e com suas dicas. Eu realmente gosto desse blog. Gratidão.

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