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Por que o GTD e não outro método de produtividade

Toda vez que faço algum tipo de crítica ao kanban, chovem tantos comentários nas minhas redes sociais! Por isso, resolvi escrever um post para ficar como referência e indicar como resposta sempre que alguém me perguntar: “mas por que essa treta com o kanban?”.

Quero começar dizendo que minha crítica não é “ao kanban” especificamente. Minha crítica é ao conceito (que considero) ultrapassado de produtividade do ponto de vista da exploração (sim, o post é uma paulada – segura aí).

Por que eu me interessei (e continuei apaixonada) pelo GTD? O GTD não é um método de produtividade?

O GTD é um método de produtividade que nasceu da contracultura. David Allen, o autor, fazia faculdade em Berkeley nos anos 1960. Ele foi professor de karatê. Estudou História. Ele entrou no mercado corporativo por acaso, porque simplesmente era bom em enxergar coisas que os outros lá inseridos não viam.

Por ter o viés oriental do karatê, o GTD traz muito da filosofia zen de respeito ao outro e do que hoje se chama de mindfulness. Não se trata de fazer mais, mas de estar presente. De estar apropriadamente engajado com o que você está fazendo. De aproveitar bem o tempo – e, muitas vezes, a maneira mais produtiva de aproveitar o tempo é descansar, relaxar, ficar sem fazer nada, tão importante quanto qualquer outra atividade de “esforço”.

Você sabe de onde nasceu o conceito de produtividade?

Nem precisa ir até Marx e associar produção com consumo (como de fato é e resume tudo). Explicar o que é mais valia e exploração. A gente pode ir no guru dos negócios – Peter Drucker – e dizer que produtividade é a métrica da boa gestão. Uma empresa eficiente é uma empresa produtiva.

As máquinas da primeira e da segunda geração da Revolução Industrial fizeram com que o homem trabalhasse menos? Não. As máquinas fizeram com que o homem tivesse que trabalhar mais para dar conta da velocidade de produção das máquinas. Isso se reflete até hoje, com a velocidade da tecnologia, com o mundo 24/7 que a gente vive.

A produtividade nasceu como uma maneira de medir se tem se feito mais coisas em menos tempo. Gastando menos com o trabalho humano e gerando mais lucro. Isso era o conceito de produtividade.

Em algum momento, a produção se tornou seriada (Ford). Esse modelo evoluiu para outro (Taylor). Até chegar no auge da coisa toda, com o modelo japonês (Toyota), quando chegamos ao conceito de empresa enxuta, cuja uma das práticas é o kanban. O problema não é o kanban. O problema não são os “métodos ágeis”. Minha crítica é ao culto a essas práticas, que representam outra coisa que as pessoas nem desconfiam, nem percebem, e incentivam. Simplesmente não é o que eu faço, porque não é o modelo com o qual eu me identifico. Não está, nem de longe, no mesmo balde que o GTD, porque não é a filosofia que o GTD propõe.

Hoje, a gente tem um capitalismo financeiro que permeia todas as esferas da vida social e do trabalho. Tudo gira em torno da gestão – do Estado ao indivíduo. Se você não for “o gestor”, o empreendedor de si mesmo, você é um fracassado por natureza. Otimizar o tempo e os recursos é fundamental para ter “sucesso”. Se você fracassou no mundo da meritocracia, você apenas não se esforçou o suficiente.

Eu tenho preguiça só de pensar nesse papo, porque para mim a vida é mais do que isso e obviamente as condições das pessoas são deveras mais complexas. E o GTD vai exatamente nessa contramão também.

O GTD não é para quem quer correr mais rápido na rodinha do hamster. Não é para automatizar os processos a ponto de você virar um robô e fazer as coisas no automático. É sobre você viver melhor. Pensar melhor nas suas coisas. Aproveitar melhor a vida.

Flexibilização, terceirização, controle de qualidade, kanban, just in time, kaizen, eliminar desperdícios, cultura de participação, cultura de colaboradores – tudo isso, tão normalizado hoje, apenas representa um estilo de vida nocivo às pessoas e ao planeta que eu estou dizendo “não, obrigado”.

Não estou negando o sistema em que vivemos. Estou buscando uma maneira de trabalhar de forma mais gentil comigo mesma. Com os seres humanos de maneira geral. Sem ficar doente. Sem exploração. Porque todas as palavras bonitinhas descritas no parágrafo anterior apenas representam cada vez mais tendências de precarização do trabalho, de informalidade, de exploração de quem precisa aceitar determinadas condições para simplesmente ter um emprego. Não é “opinião”.

Eu não estou de brincadeira aqui neste mundo, sabe? Não estou aqui para explorar o método da moda e ganhar dinheiro em cima das pessoas. Eu quero fazer diferença, no sentido de minimizar os efeitos que esse sistema opressor tem em cima de todos nós, no planeta, no universo.

Eu me identifiquei com o GTD muito antes de estudar a fundo sobre sociologia do trabalho, ciências cognitivas, midiatização e temas relacionados, porque no fundo sempre foi o lado que eu acreditei mais, mesmo sem ter esse conhecimento.

Você sabe por que o GTD não é unanimidade no mundo corporativo? Porque não é qualquer empresa que quer que o funcionário faça uma análise da vida e descubra que o emprego dele não é legal. Que os valores dele não estão alinhados com a empresa, porque a empresa explora o meio ambiente, por exemplo. Agora, você pode ter certeza que toda empresa que pense sobre isso vai amar o GTD, como é o caso de muitas (porém não tantas, infelizmente, ao redor do mundo).

Assim como tem gente que adora trabalhar 24h por dia, ignorar a saúde e a família em detrimento do trabalho. Cada um com as suas escolhas, que se baseiam em valores.

Eu que não automatizo o meu cérebro, e não incentivo práticas que vão na contramão do que eu acredito.

Não se trata de quem está certo ou errado, e sim de valores e opiniões. 😉

Esses são os meus valores e a minha opinião, e por que eu defendo o GTD.

E sei que me acompanha quem acredita nisso também. Cada um acredita, incentiva e constrói o mundo que quiser.

Você acredita em outro modo de viver, de trabalhar e de fazer as coisas? Tá tudo bem também. So não me obrigue a concordar. Valor a gente não escolhe – a gente tem.

Todas as fotos deste post são imagens do autor do método GTD, David Allen, vivendo a vida da maneira como eu acredito que tem que ser.