Hoje no programa da Ana Maria Braga (passa na hora em que estou arrumando o quarto, então deixo a tv ligada no começo) passou uma reportagem sobre pessoas que guardam tralha e até lixo dentro de casa. Uma vez eu tinha visto uma reportagem semelhante no GNT e já tinha ficado horrorizada. Procurei o link online da matéria mas ainda não está disponível – talvez amanhã esteja -, mas mesmo assim precisei vir até aqui comentar a respeito. Dei uma busca no Google e encontrei a seguinte matéria:
Para entrar no quarto do representante comercial Antí´nio Rodrigues Veneziano, 36, é preciso estar em boa forma: só é possível abrir a porta até a metade, já que atrás dela começam as estantes que comportam seus mais de 10 mil discos de vinil. Pode-se imaginar que ele seja um colecionador apaixonado pelos antigos LPs. Um olhar mais atento mostra que não é bem isso. O quarto tem tantos objetos acumulados que a circulação é difícil, e seu corpulento ocupante teve de trocar a cama de casal em que dormia (guardada em outro canto da casa) por uma bem mais estreita, de solteiro.
Em torno dela estão dispostos seus preciosos pertences: sete rádios (só um funciona), duas TVs, 3.000 cassetes, sete caixas abarrotadas de papéis, revistas e jornais velhos, malas repletas de roupas (algumas que ele não usa há 15 anos), máquinas fotográficas antigas, um violão e uma guitarra (que ele não sabe tocar), quadros, dez caixas de som, sendo quatro da década de 40… e por aí vai.
“Sou um depósito. Tudo o que as pessoas têm dó de jogar fora, mas de que querem se livrar, elas passam para mim, pois sabem que vou guardar.†Essa mania de acumulação, diz, ajudou a acabar com seus dois casamentos. “Minha primeira mulher aproveitava quando eu estava no trabalho e dava as minhas coisas para os outros. Claro que isso terminava em briga. A segunda não implicava, mas tinha um filho que mexia em tudo e me deixava possesso. Eu brigava com ele e ela brigava comigo.â€
A quem se espanta com tanta tralha, Antí´nio justifica: “Eu sempre acho que vou precisar de algumas dessas velharias um dia. Mesmo as quebradas, que posso consertarâ€. Ele admite, porém, que isso nunca aconteceu.
â€œí‰ o argumento mais comum de quem não consegue se desfazer de coisas, mesmo que elas não tenham nenhuma utilidadeâ€, afirma a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, especialista em medicina do comportamento pela Universidade de Chicago (EUA). Por uma razão simples: essas pessoas nunca acham que o que guardam é inútil, por mais velho e quebrado que esteja. “A maioria nem sabe que a mania pode ser uma doençaâ€, diz a psiquiatra.
Também não é difícil entender por quê. Quase todo mundo coleciona ou colecionou alguma coisa na vida, e a diferença entre o colecionador comum e o colecionista compulsivo é uma questão de medida. A grosso modo, dá para dizer que o primeiro tem um foco de interesse claro e é movido pelo prazer do hobby; o segundo acumula coisas variadas e desconexas por crença na suposta utilidade e uso futuro. O primeiro em geral é organizado; o segundo, nem sempre consegue ser, porque o acúmulo constante acaba dificultando qualquer arrumação.
Além disso, os colecionistas parecem se enxergar como a formiguinha da fábula, que está sempre se precavendo contra o inverno rigoroso, mas estão mais para o furão (ou ferret), o roedor que costuma carregar para a “toca†tudo o que encontra, do celular ou molho de chaves do dono ao controle remoto da TV.
“í€s vezes me irrito com a minha própria mania, porque é tanta bagunça que não encontro o que queroâ€, admite, bem-humorada, a cabeleireira Marina Estela Nascimento, 38. No apartamento em que mora com os dois filhos -de 6 e 13 anos- e o marido, é preciso prestar atenção a cada passo para não esbarrar em uma das pilhas de objetos e caixas. Sentar no sofá também pode ser complicado -o espaço é constantemente ocupado por dezenas de bonecas antigas, roupas e revistas. “Acho que tenho muito apego í s coisas, sei lá se é alguma coisa psicológica. Não gosto de me desfazer de nada. Será que sou doente?â€, pergunta.
O marido responde: “Se é doente eu não sei, mas ela parece uma lixeira. Não pode ver nada na rua que pega, sempre com a desculpa de que vai reformar. Mas, olha aqui, ó (tira algumas molduras quebradas de trás de um armário), nunca servem para nada, só faz bagunça. Um dia vou ter de morar na garagemâ€, diz Carlos Batista Nunes, 48.
Entre as utilidades de Marina estão 63 potes plásticos para armazenar alimentos, muitos ainda embalados, porque ela só usa seis, além de 28 vidrinhos de essência para bolo, 27 deles com validades vencidas entre 2001 e 2004. A maioria está cheia. “Eu sei que não dá mais para usar o conteúdo, mas posso precisar dos potinhos, por isso não jogo fora.â€Normal ou anormal?
Em 90% dos casos, o colecionista se encaixa, em maior ou menor grau, no diagnóstico de TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), a sigla que engloba uma série de comportamentos repetitivos e mecí¢nicos que fogem ao padrão de normalidade. O mais comum é a compulsão por limpeza – lavar as mãos em excesso a ponto de irritar ou ferir a pele, por exemplo, como a que acometeu a atriz Luciana Vendramini. O segundo é justamente a mania de colecionamento. Mas é preciso tomar cuidado com o conceito de “normalidade†– nem todo colecionista sofre de TOC.
“Todos nós temos, em algum grau, aspectos de desordem mentalâ€, afirma a psiquiatra Ana Beatriz, autora do livro “Mentes & Manias – Entendendo Melhor o Mundo das Pessoas Sistemáticas, Obsessivas e Compulsivas†(ed. Gente). “Mas uma mania só pode ser considerada doença quando chega ao ponto de provocar transtornos significativos na vida da pessoa, seja no setor familiar, social, afetivo ou profissional.â€
As desordens são comuns, diz ela, porque nenhum ser humano tem o cérebro perfeito, ou seja, que produza em doses exatas todos os combustíveis cerebrais (os neurotransmissores) necessários para o desempenho de cada função. Assim, qualquer desequilíbrio, por pequeno que seja, traz conseqí¼ências.
No caso de TOC, aparelhos modernos que permitem visualizar o funcionamento cerebral constataram que seus portadores apresentam um aumento de atividade nas regiões do lobo frontal (onde se concentra a rede de neurí´nios responsável pelas atividades intelectuais, como memória e tomada de decisões) e nos gí¢nglios de base, conjuntos de células nervosas importantes para o início de ações e controle dos movimentos.
O lobo frontal tem ligação direta com o sistema límbico (responsável pelas emoções), que produz, entre outros, a serotonina, neurotransmissor responsável pela tranqí¼ilidade. Nos portadores de TOC, verificou-se que sua produção está abaixo dos níveis normais. í‰ por isso que o tratamento mais recomendado é uma associação de medicamentos antidepressivos com sessões de terapia cognitiva-comportamental.
“Esses remédios estimulam a produção de serotonina, fazendo com que a pessoa não se sinta tão ansiosa em relação ao que pode acontecer de ruim sem aqueles objetosâ€, explica Ana Beatriz.
Já a terapia cognitiva-comportamental, método mais usado para qualquer tipo de transtorno mental, trabalha principalmente discutindo as experiências vividas pela pessoa, tanto individualmente quanto em grupo. Nela, são estabelecidas metas, definidos os sintomas alvos e discutidos pensamentos e emoções que levam a pessoa a agir daquela forma.
“Todos nós temos vazios em nosso psiquismo, mas alguns têm em maior grau e tendem a depositar em objetos uma parte de sua identidade. Essas coisas passam a ser uma extensão da própria pessoa. í‰ por isso que, para elas, é tão difícil se desfazer delasâ€, explica Geraldo Massaro, psicoterapeuta do Hospital da Clínicas.
Coleção de lembranças
Isso fica mais evidente para quem não consegue se desfazer de objetos por apego sentimental, como a dona-de-casa Maria José Nascimento Kormann, idade não revelada, cujo “acervo†ocupa três quartos da casa em que mora sozinha. “São coisas que me lembram épocas em que fui muito feliz, não consigo jogar foraâ€, afirma.
Entre seus guardados estão todas as roupinhas de infí¢ncia dos três filhos, seus brinquedos e material escolar, mais de mil fitas de vídeo caseiro gravadas pelo marido, revistas da década de 60 e até canhotos de cheque em que estão marcados a data e o valor da compra dos enxovais das crianças.
Quando se casou, Maria José levou todas as lembranças de sua juventude com ela, e o marido fez o mesmo. “Nosso apartamento era entulhado de coisas, mas nenhum dos dois abria mãoâ€, lembra. “Houve uma época em que mantínhamos um apartamento alugado, em frente í casa onde moro hoje, só com todas as coisas que acumulamos. Parece loucura quando contoâ€, diz, rindo.
Organizadíssima, Maria José diz que, pelo menos uma vez por semana, ela e a faxineira retiram todas as caixas e embalagens de plásticos que acondicionam as lembranças para serem limpas e devolvidas aos armários.
Outra que aproveita o apartamento espaçoso para guardar parte de seu passado é a arquiteta Miriam Bernstein, 50, que armazena em dois dos três dormitórios disponíveis todas as roupas compradas desde a década de 70, embora grande parte das peças não lhe sirva mais. â€œí‰ que eu quero emagrecer, e aí pode ser que elas sirvamâ€, diz. Se isso já aconteceu? “Até emagreci uma época, mas aí resolvi comprar roupas novas e não usei nenhuma das que estão guardadas.â€
Não bastasse, ela também guarda revistas, documentos antigos, contas pagas (tem todos os extratos de cartão de crédito desde 1992), brinquedos e roupas dos filhos, já crescidos. A arquiteta diz que só percebeu que era tão apegada quando se interessou pela filosofia do feng shui. “A primeira linha do livro trazia a principal premissa: é preciso se desfazer do que não tem utilidade, se desapegar das coisas.â€
Ela chegou a tentar, diz. “Não adianta, é muito difícil. Em todas as vezes, eu separei, separei e voltei a colocar tudo de volta.†A filosofia sucumbiu í mania.
Fonte: Diário On Line
Para refletir nessa sexta-feira.